Sobre nossa proposta de Frente de Esquerda Socialista
Zé Maria, dirigente nacional do PSTU, fez uma polêmica há poucas semanas com os setores da esquerda que, como nós, defendem a necessidade da construção de uma Frente de Esquerda Socialista para as próximas eleições. O centro de sua argumentação reside no seguinte raciocínio:
“Só tem sentido uma frente de esquerda para as eleições se isso fortalecer a defesa do programa socialista e uma perspectiva revolucionária para a luta da nossa classe, ou seja, a defesa da luta e da organização independente da nossa classe e a necessidade de uma revolução socialista para mudarmos o país. Fazer uma frente com partidos ou organizações que não defendem esse projeto não vai somar nessa defesa, vai enfraquecê-la.”
Em resumo, para o PSTU, fazer qualquer tipo de frente eleitoral com organizações que não defendem uma estratégia socialista e revolucionária enfraquece a luta dos revolucionários. A partir dessa posição expressada pelos camaradas, queremos fraternalmente debater nas linhas abaixo.
Uma questão tática da luta revolucionária
A ideia de que fazer frentes eleitorais com organizações que não defendem a estratégia revolucionária por si só enfraquece a luta pela revolução socialista é, na nossa opinião, equivocada. Além disso, parece-nos que eleva uma tática eleitoral a uma questão de princípios. Os socialistas revolucionários participam das eleições burguesas para defender a independência de classe e divulgar nosso programa em direção a um governo da classe trabalhadora e, assim, fortalecer nossas organizações revolucionárias. Toda tática que ajude esses objetivos pode ser útil.
O PSTU, assim como nós, reivindica a tradição da Convergência Socialista (nossa antecessora), que, por exemplo, ficou 12 anos como uma corrente interna do PT, fazendo, obviamente, frentes eleitorais com correntes reformistas durante todo o ascenso do movimento operário nos anos 1980. Depois de fazer frentes eleitorais com as correntes reformistas e contrarrevolucionárias do PT, o PSTU, já após a expulsão da Convergência do PT, fez diversas frentes eleitorais com PT, PCdoB, PSOL e PCB. Na maioria das eleições que participou desde sua fundação, a organização do camarada Zé Maria esteve ou propôs (como em 2014) frentes eleitorais com partidos e organizações que não compartilham da nossa estratégia revolucionária.
Porém, se formos “descer à terra” a ideia central de seu texto escrito para essas eleições, exposta na introdução do texto, o próprio PSTU, ao formar essas frentes por tantas vezes, teria enfraquecido o seu próprio projeto revolucionário.
Para nós, trata-se de um debate tático, que leva em consideração cada momento político. Todos nossos mestres (Lenin, Trotsky e Moreno) dirigiram partidos que fizeram frentes eleitorais com partidos reformistas. O marco, para nós, trata-se de ter uma política de independência de classe nas eleições, defendendo a ideia de que a classe trabalhadora deve confiar somente nas suas próprias forças e nas eleições dar seus votos para quem não está (ao menos no momento) aliado aos patrões. A batalha contra a ideia de aliança entre trabalhadores e patrões, difundida pela ampla maioria da esquerda em nível nacional e internacional, é chave em cada eleição que participamos.
Qual FES propomos para as próximas eleições?
Para nós, as eleições de 2022 têm uma linha divisória categórica dentro da esquerda brasileira: quem compõe a frente ampla encabeçada por Lula e Alckmin e apoiada por PT, PSOL e pelas centrais sindicais majoritárias, por um lado, e quem não a compõe, por outro. A batalha pela independência política da nossa classe nas próximas eleições passará por uma explicação paciente sobre o porquê consideramos que a classe trabalhadora não tem nada a ganhar em uma frente com os patrões, como propõe Lula e a burocracia sindical.
Nesse sentido, para as próximas eleições, acreditamos que é possível construir um programa mínimo e uma chapa comum com as organizações que estão contra formar essa frente com a burguesia. Quem se apresenta com essa política, além de nós, que compomos o Polo Socialista e Revolucionário, é a Unidade Popular e o PCB, duas organizações que não são trotskistas. Obviamente temos diversas polêmicas com esses partidos, que manteremos, mas, no sentido de fazer frente à onda eleitoral lulista que se avizinha, acreditamos que é possível um acordo eleitoral com eles. As organizações do PSOL que não estão de acordo com o apoio à chapa Lula-Alckmin também seriam bem vindas. Nesse marco, acreditamos que estaríamos mais fortes para enfrentar a política de conciliação de classes da maioria da esquerda. Teríamos uma candidatura que, ainda que pequena, seria melhor e mais forte do que três candidaturas à esquerda da frente ampla divididas.
O recente exemplo chileno e a política da LIT
Surpreende-nos que, totalmente na contramão da ideia que esboça Zé Maria em seu texto, está o MIT, organização chilena que compõe a LIT-QI, mesma organização internacional do PSTU. Há menos de um ano atrás, o MIT compôs a frente eleitoral “Lista del Pueblo”, repleta de oportunistas eleitorais e sem um programa anticapitalista. Uma lista dos que se diziam “contra os partidos”. Para compor essa lista “ampla” e sem nenhum perfil classista, o MIT negou-se a compor a Frente de Unidade da Classe Trabalhadora, composta pelo nosso partido irmão, o MST, que também compõe a Unidade Internacional de Trabalhadoras e Trabalhadores (UIT-QI), e o PTR, vinculado à Fração Trotskista, representada no Brasil pelo MRT. O MIT conseguiu eleger uma deputada constituinte, María Rivera, mas, mesmo assim, poucos meses após a eleição, a Lista del Pueblo explodiu em uma briga oportunista de aparato.
Um debate que segue em aberto
Acreditamos que esse debate deve seguir dentro do Polo Socialista e Revolucionário e da esquerda que está contra a adesão ao projeto de conciliação de classes lulista. Fica colocada a pergunta aos camaradas do PSTU e da LIT-QI: Qual a política eleitoral correta? A da seção chilena da LIT-QI ou a do PSTU? Quais as diferenças que a LIT vê no Chile, onde é correto, na sua opinião, fazer uma frente com setores reformistas, ecologistas e organizações que não são revolucionárias? Do nosso ponto de vista há uma incoerência. De forma fraterna, devemos continuar esse diálogo para que possamos ter a melhor tática eleitoral. De nossa parte, propomos a Frente de Esquerda como uma tática para o enfrentamento atual ao bolsonarismo e ao projeto de conciliação de classes no qual está embarcando a maior parte da esquerda brasileira.