Jatene e Temer tem as mãos sujas de sangue: Basta de guerra aos pobres!

Marcos Benedito (CST-PSOL/PA)

A aplicação do modelo neoliberal no país, fundamentalmente a partir dos governos FHC (PSDB), Lula e Dilma (PT) e Temer (MDB), significam um brutal ataque aos direitos da classe trabalhadora, juventude e povo pobre de todo o país. Privatizações, política de ajuste fiscal, Lei de Responsabilidade Fiscal, Desvinculação das Receitas da União, pagamentos recordes da dívida pública aos agiotas do sistema financeiro nacional e internacional, aliado a uma catastrófica lógica de assalto aos cofres públicos, isenções fiscais a grandes empresas (empreiteiras, bancos, mineradoras, agronegócio) e redução drástica dos investimentos nas áreas sociais são os principais fatores que levam o país a essa profunda crise política, econômica e social da atualidade. E a segurança pública evidencia, como saúde e educação, igualmente caóticas, o propósito da política imperialista (e de seus capangas locais) para os povos explorados do mundo. Extermínio, arrocho e mais exploração.

No Rio de Janeiro, onde a organização e especialização do crime organizado, os atentados aos direitos humanos, execuções diárias como as da companheira Marielle Franco (vereadora do RJ/PSOL) e do companheiro Anderson Gomes, a Intervenção Federal como recurso final de um governo covarde (para disfarçar sua derrota na Reforma da Previdência), que sucumbe na UTI, funcionam como um “verdadeiro laboratório para todo país”. Infelizmente as cobaias humanas se multiplicam de Norte a Sul. O Pará detém as cidades mais perigosas do mundo para se viver (ou sobreviver). A Região Metropolitana de Belém (RMB) está imersa em um verdadeiro cenário de guerra. E não é de hoje. Milhares de pessoas são assassinadas todos os anos, número espantoso, voltamos a repetir: número de guerra.

A lógica da política de segurança se mostrou ineficaz para combater o crime organizado, porque seus tentáculos e interesses se apossaram e contaminaram todas as instituições do estado. O resultado se mostra nas chacinas, extermínios e crises expressas no Sistema de Segurança Pública no Pará e no país. 

Cenas de guerra – No domingo, 08/04, o cabo da Polícia Militar (PM) Hernani Rogério Silva da Costa, foi morto em suposto assalto, no bairro “40 horas”, Ananindeua/PA. Outro cabo da corporação foi assassinado no início da tarde de segunda-feira, 10/04. Trata-se do 19º policial assassinado este ano no Pará. Como em episódios idênticos, o que se viu em seguida na RMB foi mais uma chacina. 19 pessoas executadas desde as primeiras horas da tarde do dia 11 até a madrugada seguinte.

As vítimas apresentam sempre o mesmo perfil. Seguindo a classificação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais de 75% delas são negras (pretas ou pardas). A maioria tem entre 13 e 29 anos de idade. São trabalhadores, gente pobre ou miserável. Executados nas periferias de Ananindeua e Belém. O crime cometido por eles foi estar no lugar errado e na hora errada. Ficaram sob a mira impiedosa de milicianos e grupos de extermínio.

Crime, castigo e execuções

Segundo a CPI das Milícias e Grupos de Extermínio no Estado do Pará, instalada pela Assembleia Legislativa do Estado do Pará (Alepa), após a tenebrosa chacina dos dias 04 e 05 de novembro de 2014, quando foram executadas quase 15 jovens em Belém, as milícias nasceram no interior dos batalhões da PM, porque “a cultura organizacional da corporação favorece a formação de grupos criminosos”. No Requerimento para a instalação da CPI, o então deputado estadual Edmilson Rodrigues (PSOL), descreve o cenário da Chacina de Belém, que é idêntico ao que a população da RMB presenciou na semana passada:

Belém viveu uma noite de execuções, terror e medo, na última terça-feira, 4 [de novembro de 2014], e madrugada da quarta-feira, 5. Tudo começou após a execução do cabo Antônio Marcos da Silva Figueiredo, conhecido como Cabo Pety, da Ronda Ostensiva Tática Metropolitana (Rotam) da Polícia Militar, quando diversos áudios, vídeos e páginas de pessoas apontadas como militares passaram a convocar a tropa para ir às ruas fazer “uma limpeza” na cidade e revidar a morte do colega de farda. O pânico tomou conta das redes sociais. Foram muitos os relatos de moradores dos bairros periféricos da Terra Firme, Guamá, Jurunas e Canudos, entre outros, sobre o barulho de tiros e o medo de saírem de suas casas. Inclusive, recebi vários pedidos de socorro no meu Whatsapp. A cidade ficou sitiada. Pela manhã, o governo do estado confirmou oito mortes na madrugada, além do Cabo Pety, mas, dois dias depois, a chacina fez a sua 10a vítima, um deficiente mental ferido à bala, que estava hospitalizado.

Na madrugada, foram mortos Eduardo Felipe Galúcio Chaves, de 16 anos; Bruno Barroso Gemaque, de 20 anos; Alex dos Santos Viana, de 20 anos; Jefferson Cabral dos Reis, de 27 anos; Márcio Santos Rodrigues, de 21 anos; César Augusto Santos da Silva (sem idade divulgada); Marcos Murilo Ferreira Barbosa, de 20 anos; Nadson da Costa Araújo, de 18 anos; e Jean Oscar Ferro dos Santos, de 33 anos. Os crimes ocorreram nos bairros da Terra Firme, Jurunas, Guamá, Marco, Tapanã e Conjunto Sideral. Na quinta-feira, 6, Arlesonvaldo Carvalho Mendes, de 37 anos.”

Como vimos, jovens, periféricos, executados um verdadeiro processo de higienização social. Ainda segundo a CPI da Alepa, o marco histórico do nascimento das milícias no Pará remonta a década de 1990 e um evento em particular serve como marco geral desse processo: a atuação de policiais da Polícia Militar na Chacina do Tapanã (bairro da capital), quando três jovens (sendo dois irmãos) foram executados após um cabo PM ser assassinado em Ananindeua.

Por conta dessa chacina, os mais de 20 policiais indiciados no Inquérito Policial Militar estarão, pela primeira vez no banco dos réus, em agosto deste ano. Dentre eles, figura o atual deputado estadual pelo PSD, o Ten. Cel Neil, que na época era 2º Tem. da PMPA.

Sistema em crise e carnificina

No dia seguinte a chacina de 11 e madrugada de 12 de abril de 2018, o que vimos foi uma tarde de carnificina no maior complexo penitenciário do Estado, onde ficam os Centros de Recuperação Penitenciário do Pará (CRPP´s), localizado no distrito de Americano, zona rural do município de Santa Isabel do Pará. Uma tentativa de resgate de presos resultou em 21 mortes, entre presos, bandidos envolvidos no resgate e um agente penitenciário. Outros 4 agentes ficaram feridos quando mantidos reféns.

Esse é o resultado de um sistema de segurança falido e da política de guerra às drogas, que se demonstrou completamente falida. Em 2006, Lula da Silva (PT), sancionou a nova Lei de Drogas, que garantiu super poderes ao auto de infração e a autoridade policial. O resultado foi um brutal encarceramento em massa. Promovido de forma ilegal, pois 40% dos presos sequer foram julgados. O Brasil atingiu a marca de detentor da 3ª maior população carcerária do planeta, mais do que dobrando de 2006 até aqui. Cadeias superlotadas, maioria jovens, negros, réus primários, acusados de tráfico por portar pequenas quantidades de maconha, virou uma bomba relógio, como a que explodiu em Americano na terça-feira (11).

Outros fatores convergem para esse quadro de crise. Segundo denúncia anônima de um agente do Batalhão de Policiamento Penitenciário do Pará/PM, essa é uma “tragédia anunciada”. Não foi a primeira vez que ocorreu tentativa de resgate e propriamente fuga de presos dos CRPP’s. A maior foi em agosto do ano passado, quando fugiram mais de quarenta detentos. Segundo o policial que nos enviou seu relato, as condições do complexo penitenciário são as mais precárias possíveis. No momento da tentativa de resgaste no CRPP2 havia apenas 2 policiais, quando o exigido seria 40 e para se ter o mínimo de segurança, 18. Sem contar que as guaritas não têm qualquer segurança. A insalubridade é gritante. A falta de iluminação é lugar comum. O próprio Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em vistoria recente, exigiu providências urgentes do governo do Estado do Pará no sentido de melhorar as condições do complexo penitenciário e demais casas de custódia no estado.

Os policiais são obrigados a cumprir seus serviços nas penitenciárias, mas segundo as denúncias, os próprios não são treinados para isso. Diz o relato do PM: “não temos efetivo suficiente, armas adequadas e treinamentos, o que se torna primordial para a nossa segurança e de terceiros”. Outro PM nos denuncia as condições a que os profissionais da segurança estão submetidos: se eles se recusam a prestar serviços nas penitenciárias, são punidos e presos; os policiais sofrem com salários arrochados, “e por isso muitos são obrigados a buscar atividades paralelas e outras algumas mais seguras”. Ele não nos disse, mas subentendemos que por “paralelas” se compreende envolvimento em atividades criminosas e “mais seguras” aqueles “bicos” que os PM’s prestam como segurança de estabelecimentos comerciais privados.

Insegurança, toque de recolher e sangue

Parecia que o pico da onda cotidiana de crimes havia passado. Mas superado o hiato de quarta, na quinta (12) e sexta-feira (13), Belém e Ananindeua viveram novamente dias de guerra aos pobres. Iniciou com seis execuções nas primeiras horas do dia 12, no bairro do Jurunas. Em seguida, um trailer da PM foi atacado por bandidos no bairro da Condor, deixando uma PM ferida. Depois mais execuções promovidas por homens encapuzados em motos e em carro prata em vários bairros: Tenoné, Val-de-Cães, Cremação (em Belém) e Distrito Industrial, Paar, 40 Horas, etc. (em Ananindeua). Ainda na quinta, bandidos invadem a casa de um agente penitenciário, executam seu filho de 27 anos e deixam um amigo dele ferido.

A população fica sob o fogo cruzado. Mães choram as mortes de seus filhos. Jovens, pobres, trabalhadores, negros. A resposta vem em forma de protesto em alguns pontos da cidade, como no Jurunas, onde moradores fizeram barricadas com entulho queimado na quinta-feira (12) à noite, contra a morte de dois jovens.

O clima é de estado de sítio. Mensagens nas redes sociais, como Facebook e Whatsapp se multiplicam dando conta de uma cidade banhada de sangue. Pessoas trancadas em casa, criminosos a solta. Angústia por quem precisa trabalhar, principalmente no turno da noite.

 

Jatene e Temer também puxam o gatilho. É preciso tomar as ruas e derrotar a politica de genocídio da juventude negra

O Secretário de estado de Segurança Pública e Proteção Social, Luiz Fernandes, disse em entrevista que ele se sente seguro em Belém. Uma declaração que zomba e tripudia do povo que sai de casa e não sabe se volta vivo. A política de segurança de Jatene/PSDB, que governa há mais de 20 anos o estado, demonstrou sua completa ineficácia. Sem investimento nas áreas sociais, desvalorizando a educação e serviços essenciais como saúde, educação e lazer, sem concursos públicos e políticas de pesados investimentos sociais, a juventude fica a mercê do assédio de criminosos e sujeita a tombar frente essa lógica de higienização social e eliminação física, que só este ano, já ceifou mais de 1000 vidas por armas de fogo no Pará.

Parlamentares na Alepa clamam por Intervenção Federal. No entanto, já vimos esse filme de terror e o quão ele é ineficaz. Para desviar a atenção da opinião pública para sua derrota na aprovação da Reforma da Previdência, Michel Temer (PMDB) sitiou as favelas do Rio de Janeiro, em uma Intervenção recheada de pirotecnia e que não passa de uma farsa, pois não vai fundo nos reais causadores da violência cotidiana. A mesma coisa vimos durante o governo Dilma. O crime organizado se fortaleceu e a Intervenção nada mais representou do que a criminalização da pobreza.

Por combater essa política, executaram a companheira do PSOL, vereadora Marielle Franco dia 14/03. Crime sem resposta até hoje. Mas a classe trabalhadora começou a se mobilizar e a repudiar a Intervenção Militar e a exigir de fato investimentos sociais e não mais as políticas repressivas.

Desmilitarizar a PM e construir um forte calendário de lutas

No sábado, dia 14/04, estivemos nas ruas de Belém e do país exigindo justiça por Marielle, Anderson e todas as vítimas de chacinas e execuções. Só com muita mobilização dos trabalhadores, juventude, através de nossas entidades, como a CSP Conlutas, Intersindical, sindicatos e movimentos sociais combativos e associações de moradores, apoiadas pelo PSOL e demais partidos de esquerda, protestando nas ruas, construindo atos e manifestações públicas, conseguiremos encurralar Jatene e Temer.

Protesto contra a chacina em 2015, em Belém (Foto: Marcus Benedito)

Em vez dos governos gastarem bilhões com uma falida intervenção ou perdoando, como fez Jatene, mais de 30 bilhões de reais em impostos, ano passado, de grandes empresas (como a Hydro Alunorte), exigimos que esses governos invistam em um grande projeto de urbanização inclusiva, que não segregue a população pobre, que passe por um ousado plano de obras públicas, a fim de gerar emprego e distribuir renda, bem como investindo em abertura de concursos, construção e reformas de escolas, saúde pública de qualidade e uma efetiva política de fortalecimento de dispositivos que promovam a cultura, esporte e lazer, principalmente nas periferias das cidades. Uma forma de quebrar o narcotráfico e a exploração das pessoas para atividades ilícitas.

Exigimos, também, a desmilitarização da PM, pois está provado pela CPI das Milícias (Alepa, 2014/2015) e por estudiosos, que a cultura organizacional da corporação, com base no militarismo e hierarquia, favorece a formação de grupos criminosos.

Por fim, convergindo com a Anistia Internacional, que institui no Brasil o ano passado a campanha permanente: “Queremos nossos jovens negros vivos!”, exigimos o fim da matança e chacinas de nosso povo das periferias, a descriminalização das drogas, o fim do genocídio da juventude negra e o fim da guerra aos pobres.

 

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