A dura derrota do imperialismo ianque no Afeganistão
No aeroporto de Cabul, as imagens dramáticas que percorreram o mundo, onde se vê milhares de afegãos e afegãs tentando embarcar em um avião militar, é a prova mais óbvia da derrocada do imperialismo estadunidense.
Os ianques e seus aliados da OTAN fogem do Afeganistão enquanto o Taleban toma Cabul, sua capital, bem como as principais cidades do país. A retirada dos norteamericanos, quase 20 anos após sua invasão, deixa o país afundado no desastre.
Ela é uma das derrotas mais sérias para os Estados Unidos depois do Vietnã (1955 a 1975). E ocorre no momento da mais grave crise mundial de dominação do imperialismo estadunidense. Uma crise que é política, econômica e também militar.
O presidente Biden culpa Trump porque este concordou, no ano passado, com a retirada do Taleban. O secretário de Defesa da Grã-Bretanha, principal aliado dos Estados Unidos na invasão, classificou o acordo entre os Estados Unidos e o Taleban de “podre”.
Em fevereiro de 2020, o governo Trump chegou a um acordo com o Taleban para retirar seus soldados em maio de 2021. Biden disse que a retirada seria em setembro, mas foi forçado a adiá-la. No domingo, 15 de agosto, o Talibã conquistou Cabul.
No momento da publicação desta declaração, 6 mil soldados ianques e britânicos estão obrigados, em meio ao caos, a guardar o aeroporto da capital para permitir que seus colaboradores diretos e funcionários fantoches do governo escapem. Ashraf Ghani, o ex-presidente afegão, já fugiu do país.
O Afeganistão faz fronteira com a China, Paquistão, Irã, Tadjiquistão, Turcomenistão e Uzbequistão. Hoje, com 38 milhões de habitantes, é um dos países mais pobres do mundo. Com uma economia centralmente agrária, amplamente dominada pelo Talibã, com camponeses subjugados e pequenos comerciantes, seu principal produto de exportação é o ópio, do qual é o maior produtor mundial, com 328 mil hectares de papoulas cultivadas (para ópio e heroína). Justamente com essas safras, é financiado o Taleban, que continuou exportando por meio do contrabando.
A invasão dos Estados Unidos em 2001 procurou colocar “ordem no mundo”
A invasão começou em 7 de outubro de 2001, menos de um mês após os ataques terroristas em Nova York, Pensilvânia e Washington, que derrubaram as Torres Gêmeas (World Trade Center) e deixaram mais de 3 mil mortos e feridos.
O suposto objetivo da invasão do Afeganistão, ordenada pelo presidente George Bush, era “combater o terrorismo” e capturar Osama Bin Laden, líder da organização Al Qaeda, considerado o idealizador dos ataques, refugiado no Afeganistão e protegido por seu governo. Os objetivos e origens dos ataques que derrubaram as Torres Gêmeas nunca foram totalmente claros.
Bin Laden, nascido na Arábia Saudita, foi financiado pela CIA e pelos ianques, que lhe deram armas e treinamento para lutar contra a então União Soviética, na década de 1980, que invadiu o Afeganistão para defender um governo aliado e impedir o avanço dos movimentos islâmicos, dos quais o Talibã surgiria mais tarde.
Com a desculpa do ataque ao World Trade Center, os Estados Unidos obtiveram apoio internacional e da própria população americana para invadir o Afeganistão, e depois o Iraque em 2003 (um país que nada tinha a ver com Bin Laden ou com a Al Qaeda). Mas o verdadeiro objetivo era usar o ataque hediondo para fortalecer seu domínio enfraquecido na Ásia e aumentar seu controle do petróleo do Iraque e do Oriente Médio.
Bush e os presidentes que o sucederam, apresentando-se como “policiais mundiais”, queriam colocar a “ordem no mundo”. Vinte anos depois, ficou claro que eles encorajavam uma “desordem mundial” e que o imperialismo não se recuperou de seu fracasso militar e político no Vietnã.
Para invadir o Afeganistão, Washington contou com o apoio militar de Reino Unido, Canadá, Austrália, Áustria, Itália, Alemanha e outros países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Ele também contratou exércitos privados de mercenários da Colômbia e de outros países latino-americanos. Entre todos eles, existia mais de 200 mil soldados com o apoio de sua poderosa aviação.
Mas a invasão dos Estados Unidos, apesar dos bombardeios e massacres que produziram um verdadeiro genocídio, que causou 200 mil mortes e milhões de feridos e refugiados, nunca conseguiu consolidar seu domínio sobre todo o território. O Taleban continuou a controlar, com algum apoio popular, parte do sul do Afeganistão.
Os Estados Unidos e seus aliados da OTAN dizem que gastaram 1 trilhão de dólares para manter um enorme exército de ocupação. Os invasores computaram cerca de 8 mil mortos, incluindo tropas americanas, de outros países da OTAN, e mercenários contratados por eles. Estima-se que 88 bilhões de dólares foram gastos no treinamento de 300 mil soldados afegãos, que agora se renderam sem combate.
Mais uma vez, fica claro que uma força invasora não pode consolidar um exército local a seu serviço de forma eficiente. Os fatos mostraram o apoio afegão aos estadunidenses era artificial. O ódio aos ocupantes imperialistas foi a base desse fracasso. Os soldados afegãos não tinham uma causa moral, por isso não queriam confrontar seus próprios compatriotas, mesmo que estes estivessem alinhados ao Talibã.
Vinte anos depois, após as administrações de Bush, Obama, Trump e agora Biden, as forças imperialistas se retiraram derrotadas.
Talibã, um monstro criado pelo imperialismo
O Talibã é um movimento político-religioso islâmico pró-capitalista (do ramo sunita), que lidera uma federação de tribos centrada no grupo étnico pashtun. O Talibã, ou “estudantes” na língua pashto, surgiu no início da década de 1990 como uma fração da resistência afegã à invasão da ex-URSS na década de 1980. Eles faziam parte dos “mujahideen”, a guerrilha financiada pelo Pentágono norteamericano, CIA e apoiado pelo Paquistão.
Em outras palavras, o Taleban foi criado pelo próprio imperialismo norte-americano. Só que isso saiu do controle. E em 1994 o Taleban aparece enfrentando uma guerra civil com outras alas da ex-guerrilha. Em 1996 eles tomaram o poder no Afeganistão e governaram até a invasão dos Estados Unidos em 2001. Eles formaram o Emirado Islâmico do Afeganistão (uma espécie de monarquia islâmica, chefiada por uma autoridade político-religiosa absoluta, que eles querem reconstruir agora).
O Taleban estabeleceu uma ditadura islâmica burguesa, com base em sua interpretação da sharia ou lei islâmica. Eles executaram publicamente assassinos e adúlteros, amputando as mãos e os pés dos acusados de roubo. Da mesma forma, os homens tinham que deixar a barba crescer e as mulheres tinham que usar uma burca que cobrisse todo o seu corpo, não podendo circular sem a companhia de um homem, nem estudar depois dos 10 anos de idade. Eles também proibiram a televisão, a música e os filmes.
Para onde vai o Afeganistão?
Devido ao seu passado repressivo enquanto governava, e também porque é predominantemente pashtuns (40% da população), o Talibã sofre resistência de grande parte do povo afegão, especialmente nas cidades, por mulheres e por outros grupos étnicos que povoam o país.
O líder religioso Mawlawi Hibatullah Akhundzada foi nomeado Comandante Supremo do Taleban em 25 de maio de 2016. É bem possível que, como eles anunciaram, seja restabelecido um emirado ditatorial islâmico. Embora tenham entrado em confronto com os Estados Unidos, não têm um programa antiimperialista e já iniciaram negociações públicas com o imperialismo chinês, que já prometeu investimentos em lítio e cobre, e deu garantias à Rússia.
Nosso repúdio aos crimes do imperialismo ianque não significa nenhum apoio ao governo ultra-reacionário do Talibã. Por isso, desde a Unidade Internacional de Trabalhadores e Trabalhadoras – Quarta Internacional (UIT-CI), apostamos que haverá uma resistência popular significativa ao novo governo. Antecipamos nosso repúdio a qualquer ação repressiva contra as mulheres e o povo afegão em geral.
É o povo trabalhador afegão que merece solidariedade internacional para lutar por sua independência e reconstruir seu país sem invasores e sem ditaduras teocráticas de qualquer tipo.
Também é necessária a solidariedade com os milhões de refugiados afegãos que são discriminados e explorados na Ásia e na Europa, para que sejam aceitos como migrantes vindos de um país destruído pelo imperialismo, com todos os seus direitos trabalhistas e sociais garantidos.
17 de agosto de 2021
Unidade Internacional de Trabalhadores e Trabalhadoras – Quarta Internacional (UIT-QI)