Entrevista com Joao Pascoal, dirigente do MAS de Portugal

temos organizado os trabalhadores em reuniões plenárias e contestação de rua, nas difíceis condições de pandemia”

Nas últimas semanas, os bancários do Santander Totta de Portugal colocaram em marcha um movimento pelos seus direitos. Enfrentam a ganância do sistema financeiro e lutam contra as “rescisões por mútuo acordo”, semelhante aos Planos de Demissão “Voluntária” ou “reestruturações” que ocorrem no Brasil. À frente desse combate, estão os trotskistas do MAS (Movimento Alternativa Socialista), um partido socialista e revolucionário que impulsiona uma corrente sindical classista denominada MUDAR, com presença nos principais bancos do país.

Para conhecer mais essa experiência, entrevistamos João Pascoal, trabalhador do banco Santander Totta, recentemente eleito para Coordenar a Comissão Nacional de Trabalhadores do Banco. Trata-se de um organismo de representação dos trabalhadores, cuja origem remonta à Revolução de 1974 e que então funcionavam como órgãos de duplo poder dos trabalhadores nas empresas. Décadas de reação burguesa esvaziaram o poder que esses organismos tinham, mas nunca conseguiram destruí-los, sendo organismos eleitos diretamente por todos os trabalhadores da empresa.

O companheiro é um dirigente trotskista com uma longa trajetória, iniciada no movimento secundarista ainda antes da Revolução dos Cravos, integrando a Aliança Socialista da Juventude e, posteriormente, o Partido Revolucionário dos Trabalhadores, que então editava o jornal Combate Socialista. Confira a entrevista:

 


 

Combate Socialista: O que significa esse processo de “rescisão por mútuo acordo” (RMA’s) do banco Santander?

Joao Pascoal: O setor bancário em Portugal e Espanha é maioritariamente dirigido pelos grupos financeiros do Estado Espanhol. Para continuarem a reforçar o seu poder mundial e aumentar a taxa de lucro, no agravar da crise pós-pandemia, querem reduzir drástica e rapidamente os seus custos com estrutura e trabalhadores, aumentando os ritmos de trabalho ao mesmo tempo que querem despedir dezenas de milhares de bancários. Em Portugal, o Santander quer, para já, reduzir cerca de 1000 trabalhadores e dissimula esse despedimento pressionando os trabalhadores a ‘voluntariamente’ despedirem-se.

CS: Como se posicionaram os dirigentes sindicais majoritários e a Comissão de Trabalhadores em relação a esse ataque?

JP: As direções dos sindicatos maioritários, direções burocráticas do PS e PSD  (o PCP, na banca é minoritário) apesar de terem subscrito um comunicado comum por nossa iniciativa, rapidamente se afastaram da luta e acabaram por facilitar a politica de RMA’s, negociando a possibilidade dos despedidos poderem usufruir dos serviços de saúde dos sindicatos, em vez de lutarem pela manutenção do emprego. Pela nossa parte, como dirigentes da Comissão de Trabalhadores, temos recusado as RMA’s, e organizado e mobilizado os trabalhadores em reuniões plenárias e contestação de rua, nas difíceis condições de pandemia e teletrabalho.

CS: Conte-nos sobre o desenvolvimento da corrente classista MUDAR entre os bancários?

JP: A corrente sindical MUDAR surge em 2003, como alternativa ao sindicalismo burocrático, quer das correntes burguesas quer do estalinismo. Iniciou com peso no principal sindicato dos bancários em Portugal (o SBSI com cerca de 40.000 sócios), tendo crescido dos 18% iniciais até ao 30% dos votos nas últimas eleições sindicais. Entretanto também nos construímos nos outros sindicatos dos Bancários (Norte do país). Nos principais bancos temos presença e somos a maioria da Comissão de Trabalhadores no Banco Santander Totta.

CS: Qual a atitude do atual governo português em relação aos trabalhadores bancários?

JP: O governo português, agora do Partido Socialista, mas no passado também da direita PSD/CDS, sempre se submeteu aos interesses dos banqueiros e com eles colaborou permitindo grandes roubos dos vários grupos financeiros e capitalistas que já atingiram 25.000 milhões de euros, desde 2008. Quem tem pago esses buracos financeiros tem sido o dinheiro público que sai dos impostos pagos pelos trabalhadores e pelo povo. Os trabalhadores bancários são, desde 2008, muito prejudicados por esta cumplicidade governamental com os banqueiros, tendo havido grande redução do nível salarial e milhares de despedimentos nos bancos ‘falidos’/ajudados pelo governo, como o BPN, BCP, BPI, e principalmente o BES/Grupo Espírito Santo que era o principal grupo capitalista e financeiro português.

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JP: Queria expressar o agradecimento pela oportunidade desta entrevista e assinalar a importância de lutarmos pela construção de alternativa política e sindical combativa, nacional e internacional, para que a luta dos trabalhadores possa ser vitoriosa. As diferentes práticas sindicais relacionam-se sempre com projetos para a sociedade, e os que querem uma verdadeira transformação revolucionária da sociedade, com o fim da exploração e opressão capitalista, são os que estão em melhor posição para travarem uma luta democrática e permanente a favor dos direitos dos trabalhadores e por isso são também os que melhor podem dirigir com êxito as lutas da classe trabalhadora. O desafio que fica é se o vamos conseguir fazer.

(Publicado originalmente no Jornal Combate Socialista 127)


 

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