Cresce a luta operária e popular pela independência da Catalunha
Por Simón Rodríguez
Começa a desmoronar o “cárcere dos povos” constituído pelo velho Estado espanhol herdeiro do franquismo. A mobilização dos trabalhadores e do povo catalão garantiu o formidável triunfo do referendo independentista, e uma greve geral com altíssima adesão popular foi o contra-ataque diante da repressão ordenada por Rajoy. Não há espaço para “mediações”. O único caminho é continuar com a mobilização popular.
Os herdeiros do franquismo, encabeçados por Rajoy, inicialmente alegaram que o referendo independentista não tinha validade legal. Em seguida, ameaçaram usar a força para impedir a realização da consulta. Suspenderam de fato a autonomia catalã, proibiram manifestações de solidariedade em todo o território do Estado espanhol, confiscaram material eleitoral e até asseguraram que não haveria votação. Aliados ao Estado, os meios de comunicação qualificaram os independentistas como “golpistas”. Por fim, cortaram o acesso à internet nos centros de votação e lançaram contra a população dez mil policiais e guardas civis, deixando mais de 800 feridos. Mas a mobilização popular se impôs e, de forma muito mais contundente do que qualquer votação, demonstrou que está determinada a se separar do regime monárquico espanhol. Milhares de pessoas ocuparam desde a véspera os centros de votação e enfrentaram a investida brutal dos policiais, que ficaram à vontade para agredir indiscriminadamente a população com cassetetes e balas de borracha. Muitos votantes, depois de passar pela urna, formavam espontaneamente concentrações de centenas de pessoas para protegerem as escolas onde se realizavam as votações. Apesar de a repressão ter clausurado mais de trezentos centros de votação, foram contabilizados ao todo mais de 2,2 milhões de votos, dos quais 90,1 por cento a favor de uma república catalã independente. Um verdadeiro triunfo popular.
À exceção dos partidários do regime semi-franquista, que incitavam a polícia e o governo, o mundo inteiro se indignou diante das vergonhosas cenas protagonizadas por esbirros que golpeavam a pontapés e disparavam contra jovens, mulheres e pessoas de idade avançada. Rajoy justificou-se dizendo que no dia 1 de outubro “fez o que tinha que ser feito”. Ainda mais à direita, Albert Rivera, do partido Cidadãos, lamentou as “agressões contra policiais” e criticou Rajoy por mostrar vacilação e confiar demasiado na disciplina dos Mossos d’Esquadra, a polícia catalã.
Na noite de 3 de outubro, O rei Felipe VI pronunciou um discurso em que atacou as autoridades catalãs e defendeu a “unidade da Espanha”. O PP oficialista, o PSOE e Cidadãos alinharam-se com o monarca, embora o PSOE pedisse uma moção de censura contra Soraya Sáenz de Santamaría, vice-presidente e ministra do governo. Rajoy carece de apoio parlamentar para aplicar o artigo 155 da Constituição (datada de 1978), que permitiria submeter a Catalunha rebelde com o emprego de força militar.
O partido Podemos, dirigido por Pablo Iglesias, busca sacrificar Rajoy para salvar o regime e considera o referendo como não vinculante, exigindo que o PSOE leve adiante uma moção de censura contra Rajoy para impedir a independência catalã e promover um referendo pactuado com Madri. O chefe do governo catalão, Puigdemont, e a prefeita de Barcelona, Ada Colau, apostam na mediação da reacionária União Europeia. O que está em curso, segundo advertem os companheiros de Luta Internacionalista (UIT-CI), é uma “tentativa de repetir a traição praticada pelo partido Syriza quando o povo grego disse ‘não’ e Tsipras correu para negociar com a UE”. Enquanto isto, continuava a contagem regressiva para a independência, prometida para 4 de outubro em caso de vitória do referendo.
A greve geral aponta o caminho
Em repúdio à repressão e para garantir a independência, a esquerda e os sindicatos CGT, COS, Intersindical-CSC e IAC convocaram uma greve geral para o dia 3 de outubro, quando já alguns setores, como os trabalhadores portuários, vinham boicotando os efetivos policiais e as embarcações que os transportavam. Em vários centros de votação os bombeiros catalães se colocaram na defesa dos votantes contra a repressão. Ante a força da convocatória, as burocracias sindicais da UGT e CC.OO pactuaram com os patrões e o governo catalão uma “greve de país”, dividindo as convocatórias e buscando atenuar a radicalidade da greve geral.
A jornada de 3 de outubro demonstrou novamente o poder dos trabalhadores e setores populares. Dezenas de ruas e avenidas foram fechadas. Mais de 700.000 pessoas participaram de concentrações em Barcelona, 60.000 em Gerona, 45.000 em Lleida e 30.000 em Tarragona, encurralando os membros da polícia nacional e da guarda civil enviados por Madri, muitos dos quais foram expulsos dos hotéis onde se alojavam.
A luta pela independência da Catalunha está aberta. Mais do que nunca é necessário redobrar a mobilização e fortalecer a organização autônoma dos setores em luta. Para enfrentar o regime, é crucial também a solidariedade e a união dos trabalhadores e da juventude em todo o Estado espanhol. Um exemplo a seguir são as mobilizações que, em setembro, reuniram mais de 30.000 pessoas no País Basco para apoiar o direito dos catalães de decidir o próprio destino. A causa do povo catalão é parte de uma luta comum contra a repressão, os ajustes e o regime pactuado com o franquismo em 1978. Para os socialistas revolucionários, a solução de fundo, que inclui o direito de autodeterminação nacional e a emancipação social, é uma federação socialista das repúblicas da península ibérica.
Depois do êxito da greve de terça-feira, os trabalhadores, a juventude e o povo da Catalunha não podem depositar confiança no governo patronal catalão de Puigdemont nem em nenhuma “mediação” com o regime de Rajoy e a monarquia. A única garantia de triunfo está em dar continuidade à mobilização popular revolucionária e a medidas como a preparação de uma nova greve geral.