As eleições não encerrarão a crise na França
Por Josep Lluís del Alcázar, dirigente de Lucha Internacionalista (LI) do Estado espanhol e membro do Secretariado da UIT-QI
Segundo turno das eleições legislativas: voto crítico na Nova Frente Popular
04/07/2024. O Reagrupamento Nacional (RN) de Marine Le Pen venceu o primeiro turno das eleições legislativas na França, com 33% dos votos: mais de 10 milhões de votos, com uma elevada participação (67%). A extrema-direita canalizou grande parte do descontentamento popular com a deterioração das condições de vida. A esquerda institucional, agrupada na Nova Frente Popular (NFP) – com a França Insubmissa, os Verdes, o Partido Socialista, o Partido Comunista e um setor do trotskismo –, subiu para 28%. Enquanto isso, a coligação do Presidente Emmanuel Macron caiu para o terceiro lugar, com 20%, pagando o preço da política anti-operária, antipopular e repressiva de seus governos, que foi amplamente contestada (Coletes Amarelos, reforma da previdência, violência policial, mobilizações rurais, apoio a Israel). Os Republicanos, a direita da tradicional do ex-presidente Nicolas Sarzoky, obteve 10%.
Diante da ascensão da extrema-direita, a esquerda parlamentar criou a Nova Frente Popular (NFP). Tal Frente Popular não responde às reivindicações operárias e populares e à ascensão da extrema direita. Porém, não houve um reagrupamento à sua esquerda. Foram apresentados alguns candidatos de organizações da esquerda revolucionária: da Luta Operária, que obteve 350.000 votos, e também do Partido dos Trabalhadores e da Revolução Permanente.
Macron é um aliado contra Le Pen?
O segundo turno acontecerá no dia 7 de julho. Para a segunda volta foi proposta a chamada Frente Republicana, para “barrar a extrema direita”, com os partidos da coligação de Macron e da Nova Frente Popular. Procura-se justificar tal política como uma continuação do cordão sanitário para bloquear a ascensão da extrema-direita, embora tal cordão já tenha sido rompido com a crise de Os Republicanos, em que um setor, liderado pelo seu presidente Éric Cioitti, já se juntou ao bloco da extrema-direita.
Os partidos de Macron e a NFP comprometeram-se no segundo turno a retirar os seus candidatos que ficaram em terceiro lugar nos círculos eleitorais em que o RN venceu, com o objetivo de concentrar o voto anti-Le Pen. A NFP retirou 127 candidatos e a coligação de Macron 82. Alguns candidatos ligados ao presidente recusaram-se a retirar suas candidaturas para apoiar a Frente Popular se o candidato do seu círculo eleitoral fosse da França Insubmissa, afirmando que tal partido não compartilha dos valores “republicanos”.
A Nova Frente Popular já era um acordo de colaboração de classes, que subordinava os interesses da classe trabalhadora, mas a Frente Republicana vai um passo além. Significa diretamente a reabilitação de Macron pela esquerda parlamentar. Isso porque apresenta Macron como um mal menor, como um aliado contra a extrema-direita, quando foi ele quem abriu com as suas políticas as portas para Le Pen.
Há exemplos que falam por si. Em Calvados, o candidato da LFI/NFP retirou sua candidatura em favor de Elisabeth Borne, a antiga primeira-ministra de Macron, que promoveu a reforma da previdência. O mesmo se aplica a Gérald Darmanin, ministro do interior desde 2020. Foi sob a gestão desse ministro que a polícia assassinou Nahel, em junho de 2023, e depois reprimiu brutalmente os protestos. Foi também Darmarin quem apresentou a racista Lei de Imigração, aprovada em dezembro, parcialmente modificada pelo Tribunal Constitucional porque continha medidas discriminatórias, como a negação de benefícios sociais aos imigrantes. Esses são hoje os responsáveis pela ascensão da extrema-direita.
Tal acordo implícito entre a esquerda parlamentar e a direita de Macron trai as mobilizações operárias e populares e deixa a extrema-direita como a única referência para a população de rejeição às políticas do governo. Lamentamos que um setor que se afirma trotskista, como o Novo Partido Anticapitalista e o Partido Operário Independente, que já tinham aderido ou apoiado a NFP no primeiro turno, compactuem agora com o acordo republicano, que os subordina a Macron.
Não é possível preparar o terreno para enfrentar um futuro governo de extrema-direita sem questionar as políticas de Macron. Não pode haver qualquer voto operário e popular na extrema-direita de Le Pen, mas também nos candidatos macronistas. Nos círculos eleitorais em que a eleição é entre Macron e Le Pen somos a favor do voto nulo ou da abstenção.
Compreendemos as esperanças depositadas por muitos trabalhadores e jovens na unidade da esquerda parlamentar, representada pela NFP, para barrar a extrema-direita de Le Pen, que ameaça direitos e liberdades. Houve mobilizações importantes. Por isso, no segundo turno, nós, da Unidade Internacional de Trabalhadoras e Trabalhadores – Quarta Internacional (UIT-QI), defendemos o voto crítico nos candidatos da NFP, para enfraquecer a força da extrema-direita no próximo parlamento. Falamos de voto crítico pois a NFP não faz parte da solução, mas sim do problema. Isso porque pessoas que hoje compõe suas listas aplicaram – quando estiveram no governo ou mesmo ocuparam a presidência, como François Hollande – políticas a serviço do capital, como atualmente fazem outros supostos governos de esquerda, como o de Pedro Sánchez no Estado espanhol e de Olaf Scholz no Estado alemão. Portanto, ao mesmo tempo em que lutamos lado a lado com os camaradas que têm participado das mobilizações contra a extrema-direita, consideramos necessário um diálogo para convencê-los de que devemos construir uma alternativa à esquerda para barrar a ascensão de Le Pen. Uma alternativa de ruptura, anticapitalista, que responda verdadeiramente às necessidades operárias e populares.
Quer a extrema-direita obtenha a maioria absoluta, e exista um governo de coabitação com Macron, ou atinja apenas uma maioria que não lhe permita formar o governo, as eleições não encerrarão a crise na França. Será essencial retomar as mobilizações em defesa dos salários e das aposentadorias, contra as leis de imigração, em defesa dos setores públicos e do povo palestino. E – como indica a última declaração dos partidos europeus da UIT-QI (Estado espanhol, Portugal, Itália e Turquia) – avançar para a formação de um reagrupamento de forças para “construir uma alternativa anticapitalista, a serviço das lutas, comprometida com a formação de um sindicalismo combativo; que apresente um plano econômico operário de urgência face à crise; que lute por governos dos/as trabalhadores/as”.