Argentina: vamos à paralisação e mobilização no dia 24J
Editorial do jornal El Socialista Nº 575. Periódico da Izquierda Socialista, seção da UIT-QI na Argentina.
O ultradireitista Milei segue com seu plano motosserra. Não há nenhuma medida que beneficie o povo trabalhador ou a juventude, como prometeu em campanha. A tal ponto que o presidente disse que apenas dentro de 15 anos (quase quatro mandatos presidenciais) poderão ser vistos os supostos benefícios de dois terços de suas políticas. Em outro momento, falou de quarenta e cinco anos, e o porta-voz presidencial, Adorni, disse que em cem anos haverá uma “Argentina maravilhosa”.
Milei também disse, em provocação, que se a inflação de dezembro beira os 30%, é preciso saudar seu ministro da economia, Luis Caputo, porque evitou que chegasse a 45%. Mas segundo pesquisas, com uma inflação do 1% diário que se atingiu nas últimas semanas, no ano chegaria a cerca de 7 mil por cento. Tudo em nome da “liberdade” e das “forças do céu”.
O combo entre megadesvalorização, liberdade de preços, DNU [1], Lei ônibus [2] e os tarifaços que se avizinham está levando a uma verdadeira catástrofe social “de dimensões bíblicas”, para utilizar uma expressão de Milei. A pobreza e a indigência aumentam vertiginosamente, enquanto os salários estão virando poeira. Se no governo peronista os salários perderam 20% real, em um mês do governo ultradireitista de Milei eles retrocederam outros 15%, a maior queda em vinte anos.
As iniciativas oficiais significam um um fenomenal ajuste estimado em 5 pontos do PIB, cerca de 25 bilhões de dólares, que vão gerar uma recessão letal para os 44,7% de argentinos pobres (segundo o Observatória da UCA, Clarín, 31/12). Com o argumento de que haveria uma “inflação reprimida”, os combustíveis aumentaram 100% em um mês, os medicamentos 140% em dois meses e os alimentos lideram o índice publicado na CABA, superando 30% em dezembro. O impacto é sentido. Está se cumprindo a profecia de Milei da estagflação (estagnação + inflação), por isso as praias estão vazias em pleno janeiro. 46% da classe média não vai sair de férias.
Isso se une ao fortalecimento do aparato repressivo, como vemos com o protocolo de Bullrich [3], o empoderamento das forças policiais contra os que lutam, maiores penas e perseguição a organizações sociais e seus dirigentes.
Milei disse: “Apesar de que não lhes prometi um caminho repleto de rosas, mas um de esforço e sacrifício, a grande maioria dos argentinos me corresponderam com seu voto”. Assim, busca utilizar o 56% que fez no segundo turno. Mas há pesquisas apontando que menos da metade está de acordo com o DNU (Clarín, 08/01). Milei e seu gabinete estão constantemente simulando apoio, como quando saúdam desde a Casa Rosada [4] diante de uma praça vazia.
As expectativas de mudanças de seus eleitores estão se chocando contra a realidade crua. “Não pensei que o ajuste iria me atingir”, começamos a escutar.
A oposição patronal no Congresso (blocos da UCR, Pichetto, provinciais) [5] busca podar algumas arestas da lei ônibus e do DNU para negociar e acabar votando a favor. Dizem que estão de acordo com grande parte do conteúdo dos mesmos, mas não “na forma”. Com isso, acabam dando o aval.
A direção peronista, por sua vez, ainda que diz que votará contra no Congresso, chama a esperar, para que Milei se desgaste, enquanto o brutal ajuste segue seu curso. Cristina e Máximo Kirchner estão apagados e Sergio Massa reapareceu questionando a paralisação da CGT [6].
Frente a esse panorama, ocorreu uma grande mudança na situação: começou o enfrentamento operário e popular contra o plano motosserra de Milei. No dia 20 de dezembro, o sindicalismo combativo e a esquerda conseguiram uma primeira vitória contra o protocolo repressivo de Bullrich, mobilizando e fazendo um ato na Praça de Maio. E à noite, depois do conhecido DNU, milhares saíram para os panelaços em distintos pontos do país, em que tais ações exigiram “paralisação geral”.
Depois ocorreu a marcha da CGT do dia 27 aos Tribunais, que acabou sendo maior do que esperava a tímida convocatória da burocracia, com milhares de trabalhadores independentes. Há apenas 18 dias da posse de Milei, foi possível arrancar da CGT uma paralisação geral com mobilização em direção ao Congresso para o próximo dia 24 de janeiro.
Seguem ocorrendo panelaços e setores afetados pelo ajuste, como na Cultura, protagonizam distintas ações. Também há demonstrações de repúdio em recitais, em que se canta contra Milei, a exemplo da banda La Renga no estádio do Racing.
A Izquierda Socialista, partido integrante da Frente de Esquerda – Unidade (FIT-U), convoca a mais ampla unidade operária e popular para derrotar o DNU, a lei ônibus e todo o plano motosserra de mais ajuste, entrega, saque e repressão de Milei e do FMI. É preciso impulsionar a paralisação e a mobilização da CGT do dia 24J, chamando a garanti-lo, para que sejam milhares parando, marchando e exigindo a continuidade da mobilização com um plano de luta nacional.
Faz falta um imediato aumento de salários e aposentadorias, frear as demissões e os tarifaços. Rechaçar o protocolo repressivo de Bullrich e reivindicar o pleno respeito às liberdades democráticas e ao direito de protesto. E lutar por um plano econômico alternativo operário e popular, para que a crise seja paga pelos grandes empresários, as multinacionais e o FMI, impondo-lhes fortes impostos, e que se deixe de pagar a dívida externa, no caminho de conquistar um governo das e dos trabalhadores e da esquerda, que nos leve a uma Argentina socialista com plena democracia para o povo trabalhador.
Vamos à paralisação e mobilização ao Congresso e em todo o país!
Notas de tradução:
[1] O Decreto de Necessidade e Urgência (DNU), o “decretaço” de Milei, busca modificar ou revogar 366 leis na Argentina para favorecer os negócios dos grandes capitalistas.
[2] A lei ônibus é um projeto de Milei que visa ampliar seus poderes e fortalecer a repressão contra as lutas da classe trabalhadora e do povo.
[3] Patricia Bullrich foi candidata presidencial direitista que declarou apoio a Milei no segundo turno e posteriormente assumiu o Ministério da Segurança.
[4] Casa Rosada é a sede do governo federal.
[5] UCR – União Cívica Radical é um partido de centrodireita que apoiou Patricia Bullrich na última eleição presidencial. Declarou neutralidade no segundo turno entre Javier Milei e Sergio Massa.
[6] A CGT (Confederação Geral do Trabalho) é a principal central sindical argentina, dirigida pela burocracia peronista. Existe desde 1930.