Começa o segundo mandato de Trump: Abinader comemora, enquanto a diáspora se prepara para o pior
Por Manuel Gual
O presidente Abinader parabenizou o extremista de direita Trump pela “significativa” vitória eleitoral em novembro de 2024, reafirmando seus laços “estratégicos” com os Estados Unidos. Ambos compartilham a condição de milionários com ideologias racistas, conservadoras e anti-operárias, e já estiveram simultaneamente no poder no segundo semestre de 2020. Abinader adotou uma política externa de subordinação aos EUA, baseada na ideia de que existe uma “nova guerra fria”. Tal subordinação refletiu-se na transferência parcial da soberania administrativa e econômica dominicana para os Estados Unidos, com acordos de fiscalização nos aeroportos e de “céu aberto” para as companhias aéreas ianques; também na promoção de uma coalizão regional pró-estadunidense chamada “Aliança para o Desenvolvimento da Democracia”, junto com governos de direita da Costa Rica, Panamá e Equador. Além disso, ficou evidente no apoio de Abinader ao Estado genocida de Israel, com o anúncio de que o governo dominicano consideraria a possibilidade de mudar a sede da sua embaixada para Jerusalém ocupada. E mais tarde através do apoio ao sionismo durante a sua agressão genocida contra o povo palestino, a partir de 2023.
Após duas invasões estadunidenses no século XX, e as longas ditaduras pró-ianques de Trujillo e Balaguer, a dominação política e econômica dos EUA foi atualizada com instrumentos como o Acordo de Livre Comércio (DR-CAFTA), a assessoria ianque nas obras do porto de Manzanillo e a exploração das terras raras em Pedernales. A República Dominicana serve como ponto de trânsito para o tráfico de drogas para os Estados Unidos, a fim de atender à enorme demanda dos consumidores daquele país, e, na direção oposta, para o tráfico de armas dos EUA para o Haiti.
No Fórum Econômico Mundial de Davos, o ministro Víctor Bisonó reafirmou a submissão dos governistas a Trump: assegurou que não há imigração “ilegal” para os EUA a partir da República Dominicana e que o país é uma alternativa para empresas estadunidenses interessadas em ampliar seus negócios nos territórios próximos aos EUA, apoiando as extorsivas tarifas de importação impostas por Trump na região para restringir as relações econômicas com a China. Como é sabido, o governo oligárquico dominicano vê a ausência de liberdade sindical como uma vantagem competitiva, que permite às empresas pagar salários de fome, conseguindo taxas de exploração muito superiores às obtidas em outros países.
Bisonó mente sobre emigração para os EUA: a diáspora dominicana nos EUA, de mais de dois milhões e meio de pessoas, incluía em 2022 cerca de 250 mil pessoas sem documentação. E, através do chamado “caminho pelo México”, mais 300 mil dominicanos entraram nos EUA nos últimos anos. Para grande parte da classe trabalhadora e da juventude, a emigração é a única saída diante da falta de oportunidades, dos baixos salários, da repressão e da falta de direitos que caracterizam o regime dominicano. Um em cada quatro dominicanos vive nos Estados Unidos e as remessas de divisas realizadas por eles representam uma das principais fontes de renda para a economia nacional.
O lançamento de uma ofensiva racista por parte de Trump contra imigrantes latino-americanos e caribenhos constitui uma ameaça direta à comunidade dominicana em Nova Iorque e noutras cidades estadunidenses, incluindo Porto Rico, sob domínio colonial. Já foram registradas detenções arbitrárias de dominicanos, com ou sem documentação. Enquanto Abinader e seu governo de oligarcas esfregam as mãos diante das oportunidades de negócios abertas com a vitória de Trump, famílias trabalhadoras dominicanas nos EUA assistem com angústia a uma onda repressiva, que lembra aquela adotada há anos pelo regime dominicano contra os trabalhadores imigrantes haitianos.
De fato, os primeiros decretos assinadas por Trump incluem: a qualificação da imigração, via fronteira com o México, como uma “invasão” e uma “ameaça à segurança nacional”, o mesmo discurso que Abinader e a extrema direita dominicana usam para se referir à imigração haitiana; a autorização para o uso das forças militares e policiais na perseguição à imigração e para a utilização de instalações militares como centros de detenção de imigrantes, algo que também ocorre na República Dominicana. Outro decreto busca negar a cidadania estadunidense a filhos de pais estrangeiros sem residência permanente, aplicando um critério semelhante ao estabelecido pela decisão racista 168-13. Trump também ordenou uma revisão do abrigo temporário concedido a alguns imigrantes, assim como Abinader ordenou uma auditoria no Plano Nacional de Regularização de Estrangeiros.
As medidas antidemocráticas e repressivas de Trump enfrentarão obstáculos judiciais e políticos. Não está claro até que ponto serão implementadas, especialmente se sofrerem forte resistência popular. Porém, mesmo que não atinjam o nível da brutalidade autoritária do estado de exceção vigente nos últimos quatro anos de Abinader, as medidas de Trump estão sendo interpretadas pelo governo do PRM como uma legitimação de sua própria política e como um convite para ir mais longe na consolidação do apartheid dominicano. Essa é talvez a dinâmica mais perigosa que se abre para a República Dominicana com o início do novo governo Trump.