O ajuste fiscal e a governabilidade conservadora dá folego para a extrema direita (Parte II)

2- O ajuste fiscal e a governabilidade conservadora dá folego para a extrema direita

(este texto é a segunda parte do O governo Lula e a luta contra a extrema-direita). Leia a primeira parte: Nas assembleias de greve da UFRJ e UFF)

Nota-se aí, nas assembleias de greve da UFRJ e UFF, no comando nacional da FASUBRA e nesta edição do jornal da UP, o que falamos. A armação central contra a extrema direita, Lira e o congresso conservador, diminuiu o papel do governo federal de Lula/Alckmin no congelamento salarial em 2024. Essa ação do presidente Lula e do Ministro Haddad, do governo do PT, para agradar os banqueiros, o agronegócio e as multinacionais prejudica a classe trabalhadora. Os SPFs foram uma base importante da luta pelo Fora Bolsonaro, da batalha contra o 8J, mesmo assim foram atacados. Do mesmo modo, o arcabouço fiscal significou o arrocho no salário-mínimo, prejudicando a maior parte dos assalariados do país, os aposentados e quem recebem benefício social. O governo Lula também não revoga medidas como a reforma trabalhista, previdenciária, NEM ou a escala 6×1. Chama a atenção que para as tropas golpistas, que colaboraram diretamente na intentona golpista do 8J, como PFR, houve um reajuste imenso agora em 2024. Isso não ajuda nada na luta contra a extrema direita. Ao contrário da munição para o bolsonarismo.

Por outro lado, a linha central contra a extrema direita, Lira e o congresso gera a sensação de que o governo Lula não tem nenhum papel nesta questão. Mas ele tem. Vejamos. O governo Lula/Alckmin negocia e pactua Ministérios e Cargos, mantendo uma governabilidade conservadora com setores ultrarreacionários como Lira e o centrão, que estão dentro do governo com Ministérios. Do mesmo modo que assassinos de sem-terra e povos indígenas como o agronegócio de Favaro ou golpistas como Mucio, bem como o presidente bolsonarista do Banco Central. O MDB de Michel Temer possui 3 ministros. O PSD de Kassab que integra o governo de SP possui 3 ministros. O nefasto União Brasil, 3 ministros. O Republicanos, partido da Igreja Universal e de Tarcísio de Freitas, 1 ministro. E o PP de Arthur Lira está com um 1 ministro. E mesmo votando contra o governo, com a oposição Bolsonarista, esses ministros seguem lá, acumulando força para a direita e para a extrema direita. Lula tem como linha central, consciente, atrair e manter em seu governo um setor ultrareacionário.

Lula não ouviu os manifestantes que em sua posse já gritavam “sem anistia”. Nem ouviu quando no dia 9 de janeiro de 2023 esse grito voltou a se repetir nos atos após a intentona golpistas. Sendo que Lula não convocou esses atos de rua. Lula nunca defendeu a prisão de Bolsonaro abertamente. Essa prisão seria qualitativa no enfrentamento à extrema-direita no Brasil. Essa semana, no dia 27/06, foi fundamental a prisão dos chefes da tentativa de golpe na Bolívia. Na prática hoje Bolsonaro e a parte da cúpula militar que o apoio na intentona de 8J, estão praticamente anistiados pelo judiciário e pelo próprio governo Lula, que não tem uma posição ofensiva sobre esse tema. Isso é absurdo e precisa ser dito como nome e sobrenome.

A realidade é que o ajuste fiscal do governo Lula e a governabilidade conservadora da frente ampla permite uma acumulação de forças para a direita e a extrema direita. E uma eventual falência do projeto de colaboração de classes liderada por Lula e pelo PT pode pavimentar o caminho da extrema direita. É o que ocorreu na Argentina com o fracasso do kirchnerismo e a vitória eleitoral de Javier Milei. Ou a situação do Chile, com desgaste da frente ampla chilena do governo e Boric (integrada pelo Partido Socialista, Partido Comunista), ampliando espaço para os pinochetistas de Antonio Kast. Não podemos desconsiderar isso.

O fato é que governo de colaboração com nossos inimigos de classe, como é o caso do governo Lula, tem como estratégia desmobilizar a classe trabalhadora e os setores populares. Visa desmoralizar as greves e lutas preparando retrocessos e derrotas. Por isso não podemos diminuir o papel do governo Lula. Ao mesmo tempo em que precisamos construir uma alternativa pela esquerda, sem patrões, com independência política da classe trabalhadora, inteiramente contra a direita e a extrema direita. Se olharmos para o exemplo da Argentina, governada por Milei, veremos isso expresso nas lutas unificadas contra o ajuste e autoritarismo e também na construção de uma alternativa política expressa na FIT-U (Frente de Esquerda e dos Trabalhadores – Unidade), como uma força diferente do kirchnerismo. Nossos camaradas da Esquerda Socialista  (seção da UIT-QI na Argentina) são parte dessa batalha.

2.1- Seria um governo em disputa? Um campo progressista?

Nas referidas assembleias de greve da UFRJ e UFF, as falas dos camaradas do MLC-UP passam a impressão de que poderia haver uma definição de o governo Lula estivesse em “disputa” ou que ele compõe uma espécie de “campo progressista”. Essa impressão é motivada pelo seguinte. Nos momentos em que os camaradas da UP e do MLC dessas categorias se referem ao governo Lula sempre em termos mais ou menos assim: “elegemos o Lula para avançar em nossas pautas e derrotar a extrema direita”. E nas poucas vezes em que realizaram algumas críticas – em meio a uma greve – isso foi feito de forma tal que passava a impressão de que o governo Lula/Alckmin poderia ser levado para a esquerda. Ou realizado de forma leve, quando dizem que o sistema da dívida ou que a política do centrão para o orçamento conta com a “conciliação do atual governo”. Algo que não expressa a verdadeira linha do governo que é manter a aprofundar o pagamento da dívida externa e interna, religiosamente, liderando as benesses ao capital financeiro; e no congresso foge do fato de que o governo Lula e a maioria da frente ampla, juntamente com PSDB, PP, MDB, PSD, Republicanos, e o PL de Bolsonaro apoiaram a reeleição de Lira. Não por acaso, condução da mesa diretora da câmara o PT ocupa um cargo através de Maria do Rosário, do PT-RS. Não se trata, apenas, de conciliar com as posições.

A mesma sensação surge ao lermos o trecho em que o Jornal da UP cita Lula. Lá os redatores do texto dizem:

Não podemos permitir que o governo Lula continue fazendo cortes no orçamento da educação, deixando as universidades públicas em profunda crise, e fazendo arrocho no salário dos servidores públicos federais, com objetivo de seguir pagando exorbitantes juros aos banqueiros. É necessário priorizar a luta pelo enfraquecimento das bases do fascismo. E isso só será possível combatendo a extrema direita, o centrão e os banqueiros. Somente de forma organizada e coletiva, com uma luta consequente em defesa da classe trabalhadora podemos garantir solução dos graves problemas que enfrentamos”.

Os destaques em negrito são do próprio jornal. Diante do ataque do atual governo Lula – cortes do orçamento e arrocho salarial – não se vê uma formulação para enfrentar esse ataque realizado por Lula. Se coloca toda munição na luta “pelo enfraquecimento das bases do fascismo” e no combate a “extrema direita, o centrão e os banqueiros”. A crítica cria uma sensação de um conselho amigável ao governo Lula, como se Lula não estivesse conscientemente aplicando o ajuste fiscal para favorecer os banqueiros, agradar a patronal e a ala representada no congresso pelo centrão, por Lira e partidos ultrarreacionários, governadores de extrema direita. Nos temas de orçamento praticamente não há divergências entre Lula, Lira e os demais partidos. Ou quando existem são discursos de Lula que não se expressam em ações de ruptura com o arcabouço fiscal. Isso chegou a nível surreal justamente no caso do arcabouço fiscal de Lula, apoiado por Bolsonaro e Temer, a rede globo, a FIESP e a BOVESPA. Nos temas democráticos ou dos direitos das mulheres, LGBTQIA+, por exemplo, é que há mais divergências entre Lula e Lira (sem que mude o status de seu partido no Ministério de Lula).

Leia o próximo capitulo: O Governo Lula é capitalista e a esquerda precisa ser independente (Parte III)

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