É urgente a retomada da luta contra o ajuste fiscal
Gerson Lima, Combate Sindical e Diretor do SINTSEP-PA
Em 17 de abril Lula foi pessoalmente ao Congresso Nacional protocolar o Projeto de Lei Complementar-PLP nº93/2023. Apelidado desde o início do governo de “Arcabouço Fiscal”, esse projeto de lei, denominado de “Regime Fiscal Sustentável”, representa uma grande traição do governo Lula contra aqueles que nele votaram em outubro do ano passado. Lula foi eleito para derrotar Bolsonaro não somente em sua política ultraconservadora, mas também em política econômica neoliberal e de Estado Minimo. Não à toa milhões de trabalhadores saíram as ruas para pedir votos a Lula com o propósito revogar a Emenda Constitucional nº95, aprovada sob o governo Temer, mas aplicada rigorosamente por Bolsonaro/Guedes.
O PLP Nº93/2023 é o ajuste fiscal de Lula/Alckmin
O PLP nº93/2023, que tramita no Congresso Nacional, não acaba com a política econômica neoliberal e de Estado Minimo de Bolsonaro/Guedes e não enfrenta a EC 95 de Temer. A análise de diversos cientistas e ativistas sociais do campo progressista são uníssonos em afirmar que o PLP nº93 mantém a mesma perversidade das políticas de ajuste fiscal precedentes. Por isso, o PLP nº93 é o ajuste fiscal de Lula sobre os trabalhadores. Muitos analista vão além, e demonstram que o PLP nº93 melhorou a situação para o lado dos banqueiros. Por isso que o tal “mercado financeiro” recebeu com tranquilidade o anúncio do arcabouço fiscal. E se é bom para banqueiro, é ruim para os trabalhadores!
Em termos gerais, o PLP nº93/2023, como ele se auto-define, é um planejamento fiscal de médio prazo, voltado à gestão das receitas e das despesas primárias (variável) e financeiras (fixa). As despesas primárias são aquels com pessoal, encargos sociais, transferências para outros entes públicos, investimentos, manutenção da máquina pública e execução das políticas sociais; e as financeiras são aquelas com juros e amortização da dívida. Esse planejamento reforça a questionável política de metas fiscais anuais para obtenção de resultado primário, a herança maldita da LRF, um mecanismo perpétuo e intocável de contingenciamento de volumoso recurso público destinado exclusivamente ao pagamento da dívida pública. O PLP nº93/2023 reitera que as regras de metas fiscais anuais por ele definidas serão fixadas nas LDO, e desta vez pelo período de dez anos (2024-2033), período superior a possíveis dois mandatos de Lula. Seu objetivo é permitir “que o Governo consiga guardar recursos importantes para abatimento do endividamento público”. Uma década de tranquilidade para os rentistas sonegadores.
Com a EC 95 os recursos destinados às despesas primárias para um determina exercício financeiro, era reajustado, em relação ao ano anterior, apenas pela variação acumulada do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo-IPCA (inflação). Embora duramente criticado e combatido, desde sua origem, pelos diversos movimentos sociais e entidades sindicais, o governo Lula resolveu manter no PLP nº93/2023 esse temerário mecanismo de “planejamento” fiscal. Tenta se diferenciar por meio de acréscimos limitados da variação real da despesa.
Além da previsão, em LOA, dos recursos destinados ao pagamento da dívida, esses “recursos importantes” adicionais serão obtidos da seguinte maneira: Para cada 1% de crescimento sobre valor estimado de arrecadação, o governo poderá utilizar somente 70% para alocação nas despesas primárias. Os 30% restantes sobre a arrecadação adicional serão destinados direta e exclusivamente para formar uma reserva para absorver crises financeiras. Porém, se a Meta estabelecida pelo governo não for alcançada, o percentual a ser acrescido às despesas primárias sofrerá redução de 70% para 50%, mantendo-se, entretanto, inalterada a reserva de 30% dos banqueiros.
RECEITAS | DESPESAS | |
Primárias | Financeiras | |
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70% | 30% |
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0% | 100% |
Mas não só isso. Esses 70% não serão “distribuídos” equitativamente. Sua destinação os Poderes, órgãos, entidades, autarquias e fundações federais – tanto para a manutenção da gestão, quanto para a execução das políticas sociais – vai variar, em relação ao ano anterior, entre 0,6% a 2,5%.
O pobre continuará fora do Orçamento
O arcabouço de Lula/Haddad imagina o Brasil como uma Empresa S/A, da qual todos os trabalhadores pobres são empregados, com metas de produtividade a serem alcançadas e que, com seu trabalho e sacrifício, só terão direito à participação nos lucros se atingirem as metas. Os acionistas são os “investidores”, os detentores dos títulos da dívida pública, os credores do país, que não trabalham, mas que têm privilégios na distribuição dos dividendos. Em caso das metas não serem alcançadas, os trabalhadores serão os únicos a serem penalizados, com redução de 70% para 50% na participação nos lucros. Além de não mexer nos 30%, essa redução é uma garantia a mais aos acionistas de que sua “remuneração” não será afetada. Dessa forma, os acionistas, que já tem na Estatuto (LOA) percentual fixo de participação nos lucros, terão mais 30% sobre a arrecadação adicional e a garantia de sua intocabilidade.
A aplicação dessa visão na gestão fiscal vai provocar uma verdadeira guerra entre os diversos setores da administração pública federal, uma disputa a tapa por dinheiro. Os que estiverem mais perto do Palácio do Planalto ou tiverem mais audiência ou influência dentro da Casa Civil, levam mais dinheiro. Não é difícil prever que plano de carreiras, auxílio alimentação, aposentadorias e salários de servidores públicos federais ativos, aposentados e pensionistas, que são uma das despesas primárias, serão duramente atacados, e o Projeto de LDO deixa pouca margem para uma interpretação diferente disso. Enquanto isso, os banqueiros (com seus 30% garantido em lei) gozam de dinheiro e tempo livre para elaborar novas fórmulas de ajuste fiscal. Isso é o que Haddad chama de “colchão”. Lula/Haddad não apenas mantiveram o teto do Temer, como ainda colocaram, sobre ele um colchão para prover o sagrado descanso dos banqueiros parasitas, enquanto o povo fica totalmente desprovido dos serviços públicos.
O que fazer?
Em 29/11/2016 Brasília assistiu a uma verdadeira guerra campal convocada por movimentos sociais e entidades estudantis e sindicais de todo o país contra a PEC do Teto dos Gastos. Somente a lembrança desse fato já daria o rumo do que esses mesmos movimentos e entidades deveriam trilhar. Contudo, um passeio pelos portais das entidades nacionais de servidores públicos revela que, decorridos quase um mês desde a apresentação do PLP nº93/2023, as notícias sobre esse novo ajuste fiscal ainda são tímidas ou mesmo ausentes. No dia 09/05, o Fonasefe soltou uma nota confusa na qual culpa “as mídias tradicionais, associadas aos interesses do mercado financeiro”, por defenderem “todos esses aparatos fiscais que estão reduzindo a capacidade do país em investir em políticas públicas e nas estruturas garantidoras da prestação do serviço público e de sua qualidade”, responsáveis pelo Brasil se enganar e decair em crises sociais. E propõe como saída, participar das audiências públicas.
Sem citar o governo Lula e seu Ministério da Fazenda como autores da nova política de ajuste fiscal que ameaça a classe trabalhadora, o Fonasefe tentar esconder o óbvio, passa pano para o governo e passa vergonha por excesso de governismo. Dois dias depois tenta corrigir com outra nota na qual lembra o Seminário realizado pelo Fórum no dia 28/04, no qual debate-se o PLP com a presença de Maria Lúcia Fatorelli, e termina dizendo que precisamos derrotar esse projeto que ameaça os investimentos sociais. Novamente esconde a paternidade da criança.
É necessário que as entidades nacionais que compõem o Fonasefe, sem olhar a coloração partidária que orna o Palácio do Planalto, retomem as mobilizações nacionais contra as políticas de ajustes fiscais, como ocorreu em 2016 e 2017 contra Temer e em 2021 contra Bolsonaro. Que o Seminário do dia 28/04, inexplicadamente interrompido, seja retomado submetendo ao debate e deliberação coletivos as formas de enfrentamento às ameaças que rodam o serviço público, como o ajuste fiscal (PLP nº93/2023), as restrições constantes da LDO à campanha salarial dos SPFs, a reforma administrativa (PEC nº32/2020), entre outras.
Cabe às entidades de base nos Estados, conjunta e individualmente, organizarem debates sobre essas pautas e realizarem eventos de mobilização, como no dia 17/05, indicado pelo Fonasefe. O Sintsep-PA está propondo, e empenhando esforços de mobilização, que em 16/05/23 seja realizado evento de rearticulação dos sindicatos federais pela campanha salarial 2024 e contra os ataques requentados do neoliberalismo aos serviços públicos e à sociedade.