Encontro Trotsky em Permanência 2021
um balanço e alguns debates sobre um evento muito positivo
Henrique Lignani, Comitê Organizador Mario Pedrosa
Na primeira semana de agosto, como havíamos anunciado na última edição do Combate Socialista, aconteceu o Encontro Internacional Trotsky em Permanência. Os cinco dias de evento contaram com a realização de 10 simpósios temáticos, com quase 50 apresentações, e 3 mesas redondas com debatedores convidados. Além de resgatar o legado e a atualidade de Trotsky, o evento apresentou diferenças existentes dentro dos diversos grupos que hoje reivindicam o trotskismo. Tratou-se de uma iniciativa importante e que teve um resultado positivo, ainda mais quando consideramos a carência de espaços desse tipo em nosso país, onde o peso da tradição mandelista há décadas dilui a atuação do trotskismo. Dessa forma, nós, da CST, fomos parte da construção do encontro e saudamos novamente a sua concretização.
Em relação às mesas de debates, destacamos, em primeiro lugar, o debate sobre o stalinismo, com a participação dos companheiros Robério Paulino, Sean Purdy e Felipe Demier. Antes mesmo do debate acontecer, a sua relevância já estava colocada e reafirmada, como mostra o fato de grupos e personalidades stalinistas terem buscado deslegitimá-lo. Foi o caso, por exemplo, de Jones Manoel, do PCB, ao insinuar que a discussão desse tema seria desconsiderar os “problemas reais” da conjuntura em que vivemos. Na realidade, analisar o papel histórico do stalinismo, na URSS e em todo o mundo, assim como a sua reabilitação nos dias de hoje, em especial entre setores da juventude, é parte de um debate fundamental sobre a política e o programa que defendemos. Trata-se de denunciar o papel contrarrevolucionário e a política de conciliação de classes cumpridos pela burocracia stalinista, principal responsável pela derrota da revolução socialista mundial no século XX.
Ressaltamos, também, a participação da companheira Mercedes Petit, dirigente da Izquierda Socialista (Argentina) e da UIT-QI, que contribuiu para os debates sobre a “História do movimento trotskista”. Em sua intervenção, Mercedes fez um balanço da trajetória do trotskismo, sobretudo depois do assassinato de Trotsky, apontando o peso que o revisionismo teve na direção da IV Internacional, encabeçada por Michel Pablo e Ernest Mandel. Também resgatou as posições assumidas pela corrente liderada por Nahuel Moreno, que lutou sem trégua contra o revisionismo.
Alguns exemplos citados por Mercedes e que mostram o papel cumprido pelo revisionismo mandelista na IV Internacional são as revoluções na Bolívia, em 1952, e na Nicarágua, em 1979. Nos dois casos, revoluções que contavam com expressiva mobilização da classe trabalhadora e derrubaram governos, houve uma verdadeira traição por parte do setor mais expressivo do movimento trotskista, liderado, justamente, por Mandel. Em vez de impulsionar a mobilização com base em um programa socialista, para seguir aprofundando as revoluções, o que fizeram foi apoiar governos nacionalistas burgueses. Não foram casos isolados. Ao contrário, o resultado geral da política dessa direção da IV Internacional foi a permanente capitulação às direções stalinistas ou pequeno-burguesas e o abandono da tarefa de construir partidos trotskistas.
Durante essa mesa, também apareceu um debate a partir de questões enviadas pelo público. Alguns que assistiam o debate buscaram associar Nahuel Moreno e sua corrente a uma visão “etapista” da revolução. Uma caricatura segundo a qual Moreno teria apoiado direções burguesas em processos de revoluções democráticas, abandonando a defesa do socialismo para um futuro indefinido. Mercedes respondeu tais críticas a partir de exemplos concretos da atuação de nossa corrente: “Digo apenas que somos a única corrente do trotskismo que temos tranquilidade de dizer que nos construímos lutando contra a capitulação de outros trotskistas à burguesia. A esses expectadores que caluniam no chat, lhes digo: voltem a olhar para o vídeo com minha intervenção. Bolívia, em 1952; Nicarágua, em 1979. Trotskistas apoiando governos burgueses, em vez de desenvolver a revolução operária e socialista. Menos ‘etapistas’ do que nós? Por favor!”.
Por fim, é importante mencionar um último tema que atravessou todo o evento: a situação em Cuba. A própria ideia desse encontro para discutir Trotsky e o trotskismo nasceu em Cuba, em 2019, a partir do militante Frank García Hernández. Em meio aos protestos populares que explodiram no último mês de julho, Frank e outros militantes acabaram reprimidos e presos pelo governo cubano. Isso fez com que diversos participantes do evento manifestassem sua solidariedade a Frank. Porém, a grande maioria não avançava em relação às denúncias contra o governo do PC cubano. Isso ficou evidente no vídeo que encerrou o evento, onde se falou em “apoio incondicional a Cuba”, e no áudio enviado pelo próprio Frank García, que separava os problemas que levaram a população cubana a se manifestar no último mês da política implementada pelo próprio governo.
Mercedes aproveitou para abordar esse tema em sua fala, apoiando as mobilizações do povo cubano, repudiando a repressão por parte do governo e também as manobras de setores da direita e do imperialismo. Além disso, denunciou a restauração capitalista operada pela burocracia do PC, afirmando que “lutamos para que Cuba volte ao caminho de Che e do socialismo com democracia”.
Esses são apenas alguns dos debates surgidos ao longo do Encontro Trotsky em Permanência. Um evento que, sem dúvidas, foi bastante vitorioso, servindo como um ponto de apoio para o debate, sem deixar de colocar as diferenças existentes.
Para quem não pôde acompanhar o evento, os vídeos com as falas de Mercedes Petit estão disponíveis em nossa pagina e transcrição das intervenções estão disponiveis aqui. Convidamos todos e todas a acessarem!