100 Anos da Revolução Alemã
Por Mariana Morena
No final da Primeira Guerra Mundial, um motim de marinheiros deu início a uma revolta dos trabalhadores que se espalhou por toda a Alemanha, deu à monarquia e avançou para um “governo de conselho”, similar ao dos sovietes da Rússia. O partido Social-Democrata alemão traiu a revolução, se conciliou com com os setores burgueses e aristocráticos, em aliança com o comando militar, encabeçou a contrarrevolução que acabou o levante espartaquista e sua principais referência, Karl Liebknecht e Rosa Luxemburgo.
Após quatro anos de guerra imperialista, o cansaço dos soldados, trabalhadores e campesinos alemães, pela penúrias sofridas, junto com o impacto que provocou a derrota do império alemão, se expressaram em um motim na frota militar estacionada em Kiel. No final de outubro de 1918, os marinheiros se negaram a intervir na última batalha contra os britânicos. Respondendo à repressão do motim, desarmaram oficiais, ocuparam os barcos e liberaram os presos. Formaram um “conselho de trabalhadores e soldados” que tomaram o controle do porto e enviaram delegações para todas as cidades grandes alemãs. A revolução se espalhou rapidamente.
A traição do Partido Social-Democrata alemão (SPD)
Havia várias décadas que o SPD estava à frente do movimento proletário alemão e dos congressos da II Internacional. Em 1914, tinha um milhão de membros, dos milhões de filiados nos sindicatos, 110 deputados nacionais, 220 provinciais e 2.886 municipais. Publicava noventa periódicos em todo o país. Sua primeira grande traição à classe trabalhadora ocorreu em agosto de 1914, quando seus deputados votaram a favor dos créditos da guerra, apoiando a participação na “carnificina” imperialista pela repartição do mundo. A excepção foi Karl Liebknecht, que por este motivo foi expulso do partido e preso a pedido do próprio SPD. Junto com Rosa Luxemburgo e outros marxistas revolucionários que mais tarde a Liga Espartaquista, foram perseguidos e encarcerados pelo kaiser, por denunciarem a “união sagrada” e a “paz civil” para intervir na guerra contra “o inimigo de fora”.
Da revolução alemã para “a ordem reina em Berlim”
Desde 1916, o poder passou para o Comando Militar Supremo e se impôs o estado de sítio. Em abril de 1917, o SPD se dividiu em duas frações: uma maioria liderada por Friedrich Ebert, e uma de “independentes” (Kautsky, Bernstein) que – junto com os espartaquistas – estavam pela fim imediato da guerra e pela democratização, mas que carecia de um programa político. Esse ano houve massivas greves organizadas de aproximadamente 300.000 trabalhadores da indústria bélica, em Berlim, Leipzig e Dusseldorf, e em janeiro, houve um verdadeiro “ensaio de revolução”, com um milhão de trabalhadores mobilizados pelos conselhos de trabalhadores e soldados. Cada vez mais manifestantes lutaram pelo fim da guerra, pela paz sem anexações, contra a escassez da vida e da monarquia. O kaiser se viu forçado a prometer eleições gerais e Ebert assumiu a direção dos conselhos, formados majoritariamente pelos grevistas do SPD, para frear a mobilização.
Em agosto de 1918, caiu a frente ocidental alemã, e no fim de outubro se iniciou a revolta dos marinheiros que incendiou a chama da revolução por toda Alemanha. “Se o imperador não renunciar, a revolução social é inevitável. Mas eu não a quero, a odeio com toda minha alma”, declarou Ebert. O kaiser Guilherme II renunciou em 9 de novembro e todos os príncipes de todos os estados alemães fizeram o mesmo nos dias seguintes. O príncipe Max Von Baden assumiu como chanceler da república burguesa, com o poder subordinado à maioria do Parlamento. O SPD celebrou “o nascimento da democracia alemã” e se dispôs a se reconciliar com os partidos os partidos burgueses para definir a forma do Estado no marco da continuidade do regime capitalista.
Mas na noite de 8 de novembro, uma centena de líderes revolucionários haviam ocupado o Reichstag (parlamento). Formaram um “conselho de representantes do povo” e convocaram um congresso dos conselhos de soldados e trabalhadores. Enquanto isso, Ebert assumiu como chanceler do “novo governo dos trabalhadores”. Era uma farsa autêntica: o aparato administrativo e repressivo do Estado se manteve intacto. Para acabar com a radicalização do processo, Ebert fez um pacto com o alto escalão do exército e suas forças paramilitares (chamadas Freikorps, aliado à monarquia) para acabar com a influência dos conselhos.
A ausência de um partido revolucionário: um fator determinante
No final de dezembro, os espartaquistas se decidiram por se separar dos sociais-democratas e fundar o Partido Comunista Alemão (KPD). Rosa Luxemburgo redigiu seu programa, mas era tarde demais. Em janeiro, um levante encabeçado por Liebknecht, exigiu a derrubada do governo e foi violentamente sufocada. Com o consentimento do próprio SPD, que completou assim sua segunda traição histórica à classe trabalhadora, centenas de trabalhadores revolucionários foram fuzilados pelos Freikorps apenas em Berlim. Na noite de 15 de janeiro de 1919, Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht, foram presos, torturados e assassinados. A falta de uma direção revolucionária independente, consolidada e consequente, como a dos bolcheviques de Lênin e Trotsky, na Rússia, impediu a ascensão dos trabalhadores alemães de impulsionar a revolução europeia, que poderia ter mudado definitivamente o curso da história.
(Tradução Bruno Pacifico)