55 anos do golpe de 1964. Tirar as lições do passado.
No dia 31 de março de 1964, as tropas do General Olympio Mourão Filho marcharam de Juiz de Fora para o Rio de janeiro dando início ao golpe civil-militar de 1964. O presidente João Goulart foi deposto do cargo dois dias depois em sessão secreta realizada pelo Congresso Nacional, concluindo, assim, a primeira etapa desse nefasto ato. Passados mais de 50 anos, milhões de brasileiros acabam de votar regressivamente e eleger, para a Presidência da República, um militar da reserva, confesso defensor do regime dos porões golpistas de 1964.
Departamentos inteiros da CIA se especializaram em criar manuais de como depor presidentes, sabotar regimes e fomentar golpes. No Brasil, coube ao embaixador Lincoln Gordon a tarefa de ser o agente ativo do putsch. Goulart era um presidente de cunho nacional-desenvolvimentista e sua proposta de reformas de base serviu de pretexto para a criação do mito do fantasma comunista. Foi nesse contexto que as FFAA executaram o famigerado golpe, apoiadas por setores expressivos da burguesia, da classe média e da Igreja Católica.
O regime militar foi marcado por extrema violência, tortura, assassinatos e violações aos direitos humanos, como o assassinato do estudante Edson Luiz, e por políticas externa e econômica absolutamente alinhadas aos interesses de Washington.
Não pode existir anistia aos torturadores e assassinos
A lei 6683 aprovada em 1979 foi uma vitória do governo João Baptista Figueiredo. No Brasil, criou-se a falsa percepção dessa lei como algo positivo ou vitorioso, quando na verdade ela segue sendo um entrave para a devida punição dos torturadores. A lei alimentou o silêncio, alimentou o esquecimento do que ocorreu como se fosse correto varrer para debaixo do tapete tudo o que aconteceu. Esse “esquecimento programado”, no curto prazo, safou todos os meganhas da cadeia e, no médio e longo prazo, causaram problemas ainda maiores. Atualmente, vemos gente conceituada afirmando que no Brasil houve uma “ditabranda” ou que o período ditatorial não foi tão ruim assim. Temos que recordar que a lei foi aprovada por um parlamento com funcionamento totalmente enviesado, com bipartidarismo e sem legitimidade democrática para decidir os rumos do país. Ademais, alinhamo-nos às concepções filosóficas de diversos tratados internacionais como o Estatuto de Roma que consideram a tortura como um crime imprescritível.
O exemplo argentino
Na Argentina, por exemplo, 750 militares já foram condenados pelas milhares de violações aos direitos humanos. Muitos desses militares foram condenados à prisão perpétua. Recentemente, altos diretivos da Ford também foram condenados por delitos de lesa humanidade durante os anos da ditadura. No Chile, dezenas de militares e até juízes já foram condenados por crimes praticados durante a ditadura. Foi histórica a prisão de Augusto Pinochet em viagem pessoal a Londres em 1998. As comissões da verdade, sobretudo na Argentina, estão indo a fundo nos acontecimentos da história e as leis de anistia não servem de entrave para tal. Mais do que as punições em si, reivindicamos o acerto que cada país deve fazer com a história. No Brasil, durante os governos do PT tivemos a oportunidade de acertar contas contra os torturadores e assassinos da ditadura. No entanto a Comissão da Verdade, instaurada no governo Dilma, se limitou ao mero conhecimento dos fatos, sem que nenhum militar envolvido tenha sido punido.
Resquícios da ditadura
O “esquema dois” da ditadura era formado por militares financiados tanto pelo estado quanto por empresários para perseguir grupos de esquerda e militantes em geral. Verdadeiros grupos paramilitares que no fim da ditadura são parte da origem da contravenção e dos esquadrões da morte no país. É o caso do Capitão Guimarães que de oficial da Academia Militar dos Agulhas Negras se tornou um dos principais bicheiros e donos de caça-níqueis do país.
“A irmandade está ativa até hoje!” A frase é de Cláudio Guerra, ex-chefe de polícia e integrante das bandas clandestinas da ditadura, que contou com riqueza de detalhes como assassinava opositores e incinerava seus corpos. O documentário ‘Pastor Claudio’, que acaba de ser lançado, denuncia e demonstra como as milícias criadas pela ditadura seguiram e seguem ativas trabalhando para a contravenção e também através de empresas de segurança de propriedade dos generais e outras empresas envolvidas em atos violentos. A ditadura não existe mais, mas seus resquícios estão em nosso dia-a-dia.
Bolsonaro e Mourão, entusiastas da ditadura
O caminho argentino não foi alcançado pela cumplicidade dos governos pós-ditadura. Nenhum torturador foi punido. Houve e há muita mobilização por este tema e este é o exemplo que devemos seguir. Não é um acaso que um exaltador da ditadura tenha chegado ao poder. Bolsonaro, fã do torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra, reúne o maior número de militares nos Ministérios desde o fim da ditadura. Tem um governo que é pró-Ditadura Militar, entusiasta dos torturadores e neofascistas, pretende ampliar a repressão militar, restringir ainda mais a liberdade de manifestação, aumentar as agressões aos movimentos sociais. Agora, Bolsonaro orienta que os quartéis festejem o “aniversário” do golpe civil-militar de 1964, no dia 31 de março. Algo inaceitável! No entanto os novos processos de mobilização que se iniciam têm sido combustíveis importantes para que um setor da classe comece a enxergar o quão nefasto é Bolsonaro e seu governo. Ou seja, a brutalidade do ajuste econômico e as ameaças às liberdades democráticas tendem a confrontar o governo com um setor de seus eleitores trabalhadores, dificultando que o governo aplique esse projeto ultrarreacionário de ultra-direita.
As lições que agora reivindicamos como primordiais para o país são importantes de serem tiradas entre todos nós da esquerda socialista e dos setores democráticos.
Revisão da Lei da Anistia! Punição aos assassinos e torturadores da ditadura! Por memória, verdade e reparação aos familiares! Ditadura nunca mais!
Por Marco Antônio – CST/PSOL