Chile: entrevista a Rainier Rios, candidato a prefeito de Puente Alto.
Tradução: Pedro Mara | MST e UIT-QI
Nas últimas semanas ocorreu o processo eleitoral do Chile. O MST, que compõe a Unidade Internacional dos Trabalhadores – Quarta Internacional (UIT-QI), apresentou Ranier Rios como candidato a prefeito de Puente Alto, na região metropolitana de Santiago. Sua campanha teve a “educação gratuita agora” como lema e recebeu 2415 votos, 2,39%. Rainier integrou a delegação chilena no último seminário internacional do PSOL.
Os companheiros do MST informam que a abstenção foi altíssima, 61% em todo país. Em Puente Alto o índice superou 80%. Nesse contexto o governo perdeu municípios importantes como Santiago e Providencia, onde os prefeitos reprimiram duramente o movimento estudantil. A situação política iniciada com as grandes mobilizações estudantis de 2011 se manifestou no processo eleitoral através da alta abstenção e também na derrota do governo.
Após as eleições, Rainier mostrou satisfação com os resultados, sobretudo pela crise do regime binominal chileno. “Essa situação coloca na ordem do dia a necessidade de mudar a constituição pinochetista de 1980, que vem sendo defendida ferrenhamente pelos governos da Concertação e da Direita. Por isso o MST luta por uma Assembleia Constituinte desde o povo e os trabalhadores, que ponha fim ao regime bipartidário e aos privilégios dos empresários e multinacionais”, declarou.
Abaixo segue uma entrevista publicada na página da UIT-QI, onde o candidato explica suas propostas e a situação política do país.
Boa Leitura!
“Sem mais mentiras da Concertação e da direita, por uma candidatura a serviço do povo e dos trabalhadores.”
Rainier (Oso) é um jovem de 28 anos que se criou (e vive atualmente) em São José das Claras, na comuna de Puente Alto, na região metropolitana de Santiago. Foi presidente do Diretório Estudantil do Liceu de Puente Alto, ingressando depois na Universidade Alberto Hurtado no curso de licenciatura em Filosofia. Na universidade foi presidente do Diretório Estudantil e posteriormente presidente da Federação dos Estudantes, o DCE da sua universidade, no ano de 2010.
No ano passado construiu junto com outros companheiros a Assembléia Popular de Puente Alto com o objetivo de organizar o apoio dos trabalhadores e vizinhos para as lutas e as greves, sendo porta-voz até o inicio deste ano. É militante do Movimento Socialista dos Trabalhadores (MST).
1- O que te motivou a se apresentar como candidato a prefeito?
Sou como muitos jovens, participo ativamente das mobilizações que removem o país e o mundo. Sou um dos milhares que se mobilizam por uma verdadeira democracia e por direitos que nos negam os empresários e os governos. Nessas lutas estudantis, sindicais e populares percebi que no Chile tanto o governo como o parlamento estão a serviço dos ricos e não nosso.
Dentro do MST decidimos lançar uma candidatura como opção contraria a todos estes partidos que defendem, aberta ou veladamente, o legado de Pinochet. Falo da direita, da concertação, do Partido Comunista, o PRO (Partido Progressista do Chile), etc. Por isso quando os comunistas dizem que o principal inimigo é à direita, e que temos que apoiar a concertação, nós dizemos que isto é uma traição, porque a Concertação sempre tem defendido a constituição de Pinochet, inclusive Lagos a referendou como sua. Além disso, defende o capitalismo e o modelo neoliberal, e em 20 anos de governo, sempre atuaram contra o interesse dos trabalhadores.
Votar nos políticos capitalistas da Concertação, esses que agora se dizem renovados como o PRO e os comunistas, é votar para que as coisas continuem como estão. O povo e os trabalhadores devemos levantar nossos próprios candidatos, com programas a serviço de nosso interesse, que são contrários aos dos empresários, e reivindicando a luta e organização como única forma em que podemos terminar com as injustiças e desigualdades. Isto é o que me motiva a levantar candidatura em Puente Alto.
2- Então você acha que a Concertação e o Partido Comunista não são uma opção para as pessoas?
Os trabalhadores e o povo estão lutando para viver melhor. Assim tem demonstrado os estudantes, as regiões de Aysén e Magallanes, Frerina e os centros de lutas sindicais que são gritos de protesto construído sobre as costas de milhões de pessoas.
A pergunta é se estes partidos se opõem a este modelo e estão por impulsionar lutas que terminam com ele ou não. Neste sentido, a realidade nos dá uma clara resposta: os 20 anos de governo da Concertação foram tão lucrativos para os empresários quanto foram os 17 anos de ditadura militar. Na verdade os criminosos da ditadura puderam usufruir do dinheiro roubado que totaliza suas fortunas durante os governos de Aylwin, Frei, Lagos e Bachelet com total impunidade. Enquanto isso aumentou a privatização de direitos sociais, num ritmo que crescia a divida das famílias chilenas, com um reajuste do salario mínimo de miseráveis 5.6%.
Segundo as informações do Banco Central, entre 2003 e 2010, a participação dos trabalhadores com remuneração na riqueza produzida no país diminuiu de 41,2% para 38,5%, ou seja, enquanto o país produzia mais riqueza menos ganhavam os trabalhadores e mais lucravam os empresários. Como se não bastasse isso, entre 2006 e 2011 o PIB do país cresceu 21% e a pobreza em vez de cair como resultado logico, subiu 5,1%. Estes são somente alguns exemplos que demonstram que os governos da Concertação estiveram totalmente a serviço dos empresários.
O Partido Comunista chama o povo a, nada menos, que confiar nestes partidos capitalistas e colaborar através da parceria com os empresários. Então que opção verdadeira tem o povo e os trabalhadores? Se votam pela Direita ou pela Concertação estão sempre votando por quem segue governando com os empresários que nos exploram e nos oprimem. Por isto estes partidos não são uma opção.
3- Então há de se construir uma opção para os trabalhadores e o povo nesta eleição?
Sim, devemos construir esta opção. Hoje as pesquisas demonstram que mais de 80% dos chilenos não acreditam na Concertação, e isso é muito importante. Durante anos o povo acreditou, e o Partido Comunista reforçava essa crença, agitando que a Concertação era sua aliada contra a direita e os empresários. Na contramão disso, a Concertação utilizou esta confiança para desmobilizar e terminar com a organização e as lutas, fortalecendo um elo com empresários.
Por isso que queremos dialogar com todos esses companheiros e companheiras que honestamente não querem que a direita siga governando, e que na falta de opções reais de luta optaram por apoiar os faltos discursos da esquerda da Concertação e dos Comunistas. Queremos dizer que os votos, por si mesmo, não solucionarão as demandas do povo, e que somente a organização e a mobilização podem transformar as coisas em favor dos trabalhadores. Por isso propomos que “se você pode votar, use seu voto pra protestar”. Por isso queremos dizer: não apoie com seu voto os empresários e seus políticos, vote em candidatos que verdadeiramente lutam contra eles.
4- E como candidato, o que você propõe?
Trazer a construção de um município que não esteja a serviço dos empresários, e sim do povo, que não permita o lucro com a questão da habitação, que não siga precarizando a educação municipal para favorecer a educação privada, que não seja cumplice no miserável sistema de saúde e as degradantes condições dos hospitais e consultórios. Por uma cidade que seja uma conquista da organização e luta dos trabalhadores, para que, democraticamente e seguindo os seus interesses, todos decidamos o que fazer o que não fazer na cidade.
Estou convencido que devemos seguir o exemplo de luta de Magallanes, Aysén e Freirina. Temos que nos organizar, definir o que necessitam nossas famílias, unirmos a população, trabalhadores e estudantes para mobilizarmos por esse Puente Alto que realmente necessitamos e queremos. Por isso o descontentamento com esse modelo econômico, politico e social se expressará em parte com um voto nas candidaturas de luta, a outra parte, mais importante, será organizando as lutas.
Por isso os candidatos a vereadores e prefeito do povo e dos trabalhadores devem estar à frente das mobilizações, apontando para o fortalecimento das lutas. Devemos dizer claramente quem são os principais culpados pelo aumento no preço dos alimentos e o arrocho salarial, pelo qual temos que contrair dívidas de milhões de pesos por casas mal construídas em bairros sem escolas e hospitais gratuitos e de qualidade. Devemos ajudar a esclarecer entre a população que a policia reprime as mobilizações, os meios de comunicação mentem e criminalizam os que lutam, porque estão a serviço dos principais culpados pela miséria dos trabalhadores e do povo: os empresários.
5- Para concluir, que chamado faria aos puenta-altinos…
A todos os moradores e moradoras, aos estudantes e trabalhadores, aos jovens, às minorias sexuais, à terceira idade, os chamo a participar ativamente desta campanha. Quere dizer que esta é a campanha dos que lutam, dos que marcham, dos que se mobilizam. Esta é a candidatura que denuncia as mentiras e enganos da Direta, mas também da Concertação e as traições e capitulação dos Comunistas.
Somos a opção dos que se cansaram das portas fechadas do Congresso, dos dirigentes vendidos. Somos a opção dos que não suportam a impunidade dos empresários, que estão ricos roubando o direito da vida digna, a receber de verdade o fruto do nosso trabalho e dos que querem dar um futuro digno às crianças com o esforço das nossas próprias mãos. Somos os que acreditam que essas mãos devem tomar umas as outras, mas que devem ser as mesmas que vão lutar contra o conluio de empresários com os políticos.
“Se você pode votar, use seu voto pra protestar”, para lutar e organizar por: educação e saúde gratuitas e qualidade, por habitação gratuita e de qualidade, porque somos os moradores que devemos decidir em que se gasta o orçamento municipal, por cultura e esporte para educar-nos para lutar unidos.