Nagorno Karabakh: uma história de opressão nacional
Por Imprensa UIT-QI
26/09/2023. O território de Nagorno Karabakh finalmente caiu nas mãos da ditadura do Azerbaijão, depois de lutar por mais de 30 anos por sua independência nacional. Nos últimos dias de setembro, o exército do Azerbaijão invadiu a região e as milícias armadas de Nagorno renderam-se.
A população de Nagorno Karabakh (cerca de 150 mil habitantes) é formada majoritariamente de armênios. Em 1991, foi proclamada a república independente de Artsaque, com o apoio militar da Armênia e da Rússia. O conflito teve origem após a dissolução da antiga URSS.
As potências imperialistas que compõe a OTAN e o expansionismo agressivo dos regimes capitalistas da Rússia e da Turquia usaram este conflito para avançar em seus projetos de dominação dos povos e de suas riquezas para a exploração capitalista.
Foram duas guerras e inúmeros confrontos armados pela disputa do território.
Nós, da UIT-QI, sempre denunciamos esta situação, opomo-nos a uma guerra fratricida entre a Armênia e o Azerbaijão e exigimos a solidariedade internacional dos povos em defesa do direito à autodeterminação do povo de Nagorno Karabakh.
Finalmente, o povo de Nagorno Karabakh foi derrotado, com a cumplicidade de todas as grandes potências imperialistas e dos governos capitalistas da região. As consequências estão sendo sentidas pelo povo de Nagorno Karabakh, especialmente pelos armênios, com milhares de pessoas deslocadas e o perigo de uma limpeza étnica na região.
Para aprofundar o debate sobre a origem e a gênese do conflito, reproduzimos uma declaração da UIT-QI de outubro de 2020.
Não à guerra entre o Azerbaijão e a Armênia por Nargorno Karabakh! Fora a interferência dos países imperialistas (a UE e os EUA) e da Turquia e da Rússia na região!
08/10/2020, UIT-QI, reproduzido em El Socialista, Argentina, nº 481.
Uma nova guerra pelo pequeno território de Nagorno Karabakh eclodiu em 27 de setembro de 2020. Os combates armados e os bombardeios em Nagorno Karabakh e na sua capital não pararam. Centenas de soldados e civis já morreram nas batalhas. E o enfrentamento pode terminar numa guerra total entre o Azerbaijão e a Armênia. Os dois lados acusam-se mutuamente de iniciar o conflito.
O conflito é muito complexo e está lastreado numa longa história de disputas territoriais na região do Sul do Cáucaso. A população de Nagorno Karabakh (cerca de 150 mil habitantes) é formada majoritariamente de armênios. Em 1991, foi proclamada a república independente de Artsaque, com o apoio militar da Armênia e da Rússia. Desde então, tem ocorrido conflitos, sem solução.
Deve-se levar em conta que o conflito entre a Armênia (2.900.000 habitantes, de maioria armênio-cristã) e o Azerbaijão (10.000.000 habitantes, de maioria muçulmana) em torno de Nagorno Karabakh não se limita a essa região. Ele inclui outras grandes porções do território do Azerbaijão, que foram anexadas pela Armênia durante a guerra que terminou em 1994.
Nagorno Karabakh não fazia fronteira com a Armênia. Era um enclave armênio cercado por regiões do Azerbaijão. A Armênia lançou uma ação militar, que devastou o território do Azerbaijão em torno de Nagorno Karabakh. Isso separou a região azeri de Nahchevan do Azerbaijão, provocando massacres, limpeza étnica e o êxodo de centenas de milhares de azeris (cerca de 600.000 vivem atualmente no Azerbaijão). Assim, esvaziou a população desses territórios e preparou o terreno para a transferência de população da Armênia.
O outro lado da moeda é o regime capitalista do Azerbaijão, que sempre se recusou a reconhecer o direito do povo de Nagorno Karabakh de decidir o seu próprio destino.
Rejeitamos esta guerra, que só trará mais morte, destruição e miséria para os povos. Entretanto, as potências imperialistas que compõe a OTAN e o expansionismo agressivo dos regimes capitalistas da Rússia e da Turquia estão usando este conflito para avançar em seus projectos de dominação dos povos e de suas riquezas para a exploração capitalista.
Qual a origem do conflito?
O conflito tem as suas raízes em séculos de rivalidades e massacres étnicos, relacionados com a formação e as disputas dos antigos impérios capitalistas (inglês, francês, otomano e russo).
A pequena região de Nagorno Karabakh foi povoada durante séculos principalmente por uma população de língua armênia e cultura cristã.
Quando surgiu a União Soviética, através da revolução socialista de 1917 e com a expropriação dos grandes proprietários de terras e dos capitalistas, houve mais de uma década de coexistência pacífica entre diferentes nacionalidades históricas do Cáucaso. Após a morte de Lenin e com a ascensão da casta burocrática contra-revolucionária liderada por Stalin, as feridas foram reabertas. Stalin cedeu, na década de 1930, aquele pequeno território ao Azerbaijão, para dividir e controlar os povos em benefício da burocracia do Kremlin.
Quando a União Soviética se dissolveu em 1991 e o capitalismo foi restaurado, a antiga divisão dos povos ressurgiu com força, agora diretamente subordinada aos interesses de diferentes setores capitalistas e imperialistas pelo controle de territórios e riquezas. Foi assim que tanto a Armênia quanto o Azerbaijão viraram países capitalistas.
Em 1991, Nagorno Karabakh declarou-se independente. E explodiu uma guerra entre o Azerbaijão e a Armênia, apoiada pela Rússia. Em 1994, a guerra terminou com um cessar-fogo, mas sem acordo. Nagorno Karabakh tornou-se precariamente independente. Nenhum país do mundo reconheceu essa independência. Desde então, incidentes e confrontos armados se repetiram.
O novo conflito armado e o perigo de uma nova guerra fratricida
Os conflitos em torno de Nagorno Karabakh sempre foram utilizados pelos regimes do Azerbaijão e da Armênia para desviar a atenção dos povos da crise política e social nos seus países, levantando a bandeira da unidade “nacional”. Diante da nova crise capitalista aguda, os regimes do Azerbaijão e da Armênia estão sofrendo questionamentos por parte dos seus povos.
O regime do Azerbaijão é liderado pelo islâmico Ilham Aliyev, sucessor do seu pai, que governa há quase 20 anos. Ele está enfrentando questionamentos por conta da repressão e da crise social. A queda nos preços do petróleo o afetou. O país é exportador de petróleo e gás. Tem acordos especiais com a Turquia, que compra os seus hidrocarbonetos. Entre os principais investidores estão empresas britânicas, russas e turcas. Alivev declarou que não vai parar até retomar Nagorno Karabakh. Tem o claro apoio político e militar do regime turco de Erdogan, que declarou abertamente que “a luta continuará até que Karabakh seja libertada da ocupação” (Clarín, Argentina, 03/10/2020). A intervenção disfarçada dos Estados Unidos no conflito pode estar por detrás do papel de Israel, que já há algum tempo vende armas modernas ao Azerbaijão (que comprou uma grande quantidade).
Por outro lado, o atual governo da Armênia chegou ao poder na sequência da revolta popular de 2018, que derrubou o governo anterior e impôs a realização de novas eleições. A Armênia é um grande produtor e exportador de cobre e privatizou todas as suas antigas empresas estatais.
Apesar de a Armênia ter sempre contado com o apoio de Putin e da Rússia, o novo governo tem procurado ter relações mais estreitas com a União Europeia (UE) e a OTAN. É por isso que a Rússia dá um apoio tímido à Arménia e não quer cortar completamente os seus laços com o Azerbaijão. E, por sua vez, a França e a UE procuram apoiar a Armênia numa nova negociação. O imperialismo francês, país em que existe uma grande comunidade de armênios, com o seu setor capitalista, tem laços econômicos e políticos especiais com a Armênia.
Não à guerra entre a Armênia e o Azerbaijão
Com esta guerra, a classe trabalhadora e os povos da região não podem ganhar nada. Só podem ficar mais submetidos às multinacionais.
A ONU fala de “paz”, mas deixa que os confrontos ou a “paz” enganosa, com a ocupação militar de territórios, perdurem. Isso para deixar o campo livre para as multinacionais imperialistas explorarem os trabalhadores, falsamente divididos por ódios nacionais.
Só haverá verdadeira paz e coexistência justa entre os povos se o sistema capitalista-imperialista e os governos correspondentes forem derrubados e as multinacionais, que hoje impõem os seus interesses, forem expulsas. Só o verdadeiro socialismo – e não o falso socialismo que existiu na antiga URSS – pode viabilizar a superação das fronteiras nacionais e permitir que as pessoas vivam em harmonia, respeitando as suas nacionalidades e culturas, e planificando as suas economias em benefício da classe trabalhadora e dos setores populares do Cáucaso.
Nesta perspectiva de fundo, hoje é urgente parar esta guerra entre povos tratados como peões dos interesses de países capitalistas-imperialistas e dos regimes da Turquia e da Rússia.
Nós, da UIT-QI, apelamos a todas as organizações políticas, sindicais e estudantis do mundo, que se declaram como democráticas e anti-imperialistas, a pronunciarem-se contra a guerra entre o Azerbaijão e a Armênia.
Fora a interferência política e militar dos países imperialistas (a UE e os EUA) no conflito de Nagorno Karabakh!
Fora o expansionismo agressivo dos regimes capitalistas da Rússia e da Turquia na região!
Contra os massacres da população civil!
Pelo respeito à autodeterminação do povo de Nagorno Karabakh! Desocupação pela Armênia dos territórios do Azerbaijão, com pleno direito da população de regressar aos seus territórios!
Não à guerra entre a Armênia e o Azerbaijão!
Unidade Internacional de Trabalhadoras e Trabalhadores – Quarta Internacional (UIT-QI)
08 de outubro de 2020