Prostituição: o que Boulos e o PSOL devem defender?
Na última semana, Guilherme Boulos, pré-candidato à Presidência pelo PSOL, publicou um post em que se posicionava favorável à regulamentação do trabalho sexual, visando a garantia dos direitos trabalhistas e previdenciários desse setor, bem como o combate ao preconceito e ao estigma da sociedade. O conteúdo do post é baseado no acúmulo da Plataforma Vamos, que Boulos e parte do PSOL constrói. Sabemos que esse tema ainda é um tabu, mesmo dentro da esquerda, e queremos colaborar com o debate a partir do que foi discutido pelas Mulheres da CST-PSOL.
Muitas críticas foram feitas ao post. A maioria girava em torno de argumentos do tipo regulamentar seria uma forma de estimular a prostituição, e que devemos apenas combatê-la, ou que quem é de esquerda e feminista não pode, de forma alguma, defender a regulamentação, dentre outros. O post foi apagado em seguida.
Queremos explicitar que não temos quaisquer ilusões sobre a prostituição. Partimos de uma avaliação conjuntural e também histórica para nos posicionarmos acerca do tema. Com o aprofundamento da crise econômica, a única saída dos Governos é seguir atacando trabalhadoras e trabalhadores. Michel Temer tentou aplicar todo o plano de ajustes da burguesia contra a classe trabalhadora, aprovando a Reforma Trabalhista e tentando, a todo custo, aprovar a Reforma da Previdência, que, entre outras medidas, visava equiparar a aposentadoria entre mulheres e homens, quer dizer, retirar uma reparação histórica das mulheres pelas jornadas duplas e triplas a que estamos sujeitas.
Temer aprofundou medidas que já estavam sendo aplicadas com o Governo de Dilma, que, apesar de ser mulher, nunca teve uma política coerente com nossas necessidades, cortando sistematicamente das áreas sociais, por exemplo o corte na Política de Combate à Violência Contra Mulher, a aprovação da lei que intensifica as terceirizações, endurecimento das regras para acessar alguns benefícios como seguro desemprego, pensão por morte, auxílio-doença, entre outros. A desigualdade salarial também seguiu e o aborto nunca foi debatido com a sociedade de maneira séria! Há décadas que, nos momentos de crise, ainda somos as primeiras demitidas e as últimas contratadas. Os salários arrochados, o aumento do custo de vida seja através da alimentação ou dos transportes, do vestuário ou contas de água e luz, contas fixas do mês, fez crescer o número de mulheres que vêem na prostituição uma saída para se manter.
Queremos deixar claro que não consideramos a prostituição como um emprego comum que deva ser normalizado e estimulado, mas uma das mazelas que atingem a sociedade capitalista e desnudam sua verdadeira face. Também discordamos das elaborações que defendem que a prostituição é o estupro pago. A prostituição é (infelizmente) um serviço em que as mulheres optam, em sua maioria, porque não têm alternativas imediatas. Ao colocar um sinal de igual entre prostituição e estupro, desrespeita-se as prostitutas ao mesmo tempo em que fica em uma sinuca de bico: se a prostituição é estupro pago, o que fazer com as prostitutas que são efetivamente violentadas?
Temos a consciência que essa mazela não irá se findar nos próximos anos. Nem sequer nos países que fizeram a revolução e expropriaram a burguesia isso foi automático. A persistência de mulheres na prostituição foi um grande problema que os Bolcheviques tiveram que responder, traçando planos de combate à desigualdade salarial, criação de creches, etc. O processo é lento, e o foco para desestimular sua prevalência é combater as razões de tantas mulheres optarem por esse ramo: a profunda desigualdade social, a concentração de renda e a discriminação machista nos locais de trabalho, dentre outras. A regulamentação é ainda mais urgente quando falamos das mulheres trans e travestis, que, impedidas de terem vidas e trabalhos comuns, são jogadas na prostituição desde cedo. É lá onde se encontram 90% delas, e cuja perspectiva de vida é de 35 anos!
Vimos como positiva a proposta de Jean Wyllys de regulamentar a prostituição, em primeiro lugar porque essa é uma reivindicação dessa categoria e isso não pode ser ignorado. As prostitutas que vivem essa realidade querem uma lei que regulamente sua atividade e as protejam de clientes violentos ou caloteiros. Em segundo lugar, regulamentar é garantir direitos mínimos como a aposentadoria, por exemplo. Além disso, é possível batalhar por outras questões como as que envolvem diretamente a saúde dessas mulheres. Nesse ponto, se fortalece mais ainda a necessidade de legalização do aborto, pauta histórica do movimento feminista.
Acreditamos que o PL Gabriela Leite seja um avanço por pautar a regulamentação e buscar o diálogo com as prostitutas, porém ainda é insuficiente na garantia dos direitos dessas mulheres, o que torna necessario maior acúmulo e elaboração dos movimentos feministas de esquerda (Indicamos a leitura de nosso texto https://www.cstuit.com/home/index. php/2018/02/07/o-que-opinamos- sobre-o-pl-da-prostituicao- proposto-por-jean-wyllys/ para maior aprofundamento de nossas críticas).
Vimos como muito positivo que um candidato à Presidência se comprometa com a regulamentação da prostituição, tendo em vista todo o tabu existente na sociedade. Nesse momento de tanta crise na Institucionalidade e de ascenso mundial do feminismo, não é possível ceder a pressões. Não é possível apresentar meias soluções. A garantia dos direitos de todas as mulheres trabalhadoras deve ser parte de um programa que se proponha a apresentar uma solução de fundo aos nossos problemas.
Dessa forma, as mulheres da CST-PSOL somos solidárias às lutas e reivindicações das prostitutas pelo direito à regulamentação de sua profissão. Ao mesmo tempo, batalhamos contra todos os ataques dos Governos que criam o ambiente ideal para a manutenção da prostituição como alternativa de sustento para muitas mulheres.